“Vós sois testemunhas destas coisas”
Lucas 24:48
Vamos anotar três atitudes essenciais que nos levam ao cumprimento fiel da responsabilidade de testemunhar o Evangelho ao mundo.
1. A INSTRUÇÃO
A primeira atitude é aplicar-se, diligentemente, na obtenção contínua e crescente da instrução advinda na Palavra de Deus, necessária para o fiel testemunho do Evangelho. É preciso que sejamos evangélicos autênticos para podermos cumprir bem a nossa responsabilidade de verdadeiros evangelistas. Infelizmente, a expressão “evangélico“ está vulgarizada. Tornou-se modismo. É moda dizer que se é “evangélico”. É isso conveniente, pois abre portas que facilitam a obtenção de pretensões humanas de caráter material e satisfaz a interesses pessoais. É lamentável ver-se a generalização do uso da expressão “evangélico”, atribuída a pessoas interesseiras, de baixo caráter moral e de indecente comportamento, sem nenhum compromisso com Deus e com a Sua Palavra, e sem nenhuma capacitação espiritual!
É a “instrução” elemento essencial para a nossa capacitação, na realização, com sucesso, de qualquer empreendimento. “Evangélico” autêntico é o que está sempre se capacitando espiritualmente, através da constante e crescente instrução evangélica contida nas Escrituras. No crescimento permanente do conhecimento das verdades evangélicas, nos capacitamos, mais e mais, para um eficiente “testemunho do Evangelho”.
O Senhor Jesus preocupou-Se em instruir, amplamente, os Seus discípulos sobre as verdades do Evangelho, tanto pelo Seu ministério verbal, como pelo Seu digno exemplo. Em Lucas 24:44-48, após a Sua ressurreição, na iminência de partir para a Glória, já cumprida a missão que o Pai Lhe entregara, de redimir o pecador, vemo-Lo reunido com os Seus discípulos para lhes dar a última e a mais consistente lição sobre o “dever” e a “maneira” de “testemunharem” do Evangelho no mundo. Diz o texto: “A seguir, Jesus lhes disse: São estas as palavras que vos falei, estando ainda convosco: importava que se cumprisse tudo o que de mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos. Então lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras; e lhes disse: Assim está escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia e que em seu nome se pregasse arrependimento para remissão de pecados a todas as nações, começando por Jerusalém. Vós sois testemunhas dessas coisas”. “Instrução” oportuna, fundamental e abrangente sobre a necessária e fiel atuação evangelística. Note:
- A base da “instrução” eram as Escrituras (Lei de Moisés, Profetas e Salmos);
- Fora isso Ele sempre lhes falara durante o Seu ministério (“estando ainda convosco”);
- A “instrução” só aconteceria com a compreensão ampla das Escrituras (“lhes abriu o entendimento”);
- A Sua missão era o fiel cumprimento da Escrituras (“importava se cumprisse tudo o que de mim está escrito”);
- A Sua missão consistia em padecer e ressuscitar dentre os mortos ao terceiro dia, conteúdo básico do Evangelho;
- Era fundamental a propagação desse Evangelho pela pregação do arrependimento para a remissão de pecados a todas as nações, começando por Jerusalém;
- Os Seus discípulos foram, expressamente, responsabilizados como testemunhas de todas essas verdades (“vós sois testemunhas dessas coisas”).
O Senhor Jesus, ao comissionar os Seus a esse precioso ministério disse: “fazei discípulos de todas as nações... ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho mandado” (Mateus 28:19-20). Não há como ser uma testemunha fiel, sem ser um aluno dedicado e fiel no aprendizado! Jesus Cristo disse: “aprendei de mim” (Mateus 11:29). Os hipócritas religiosos, ao tempo de Cristo, sabiam muito das Escrituras, mas apenas tinham conhecimento intelectual-teológico; mera religiosidade sem nenhuma capacidade espiritual. De nada lhes valia esse tipo de conhecimento teórico. Faltava-lhes a aplicação correta na busca da “instrução” oriunda das Escrituras. Por isso o Senhor verberou a sua hipocrisia e lhes disse: “errais não sabendo as Escrituras, nem o poder de Deus” (Mateus 22:29).
Apliquemo-nos, intensamente, na capacitação espiritual, somente obtida pela “instrução” do Evangelho, para dele sermos fiéis testemunhas.
2. A PROCLAMAÇÃO
A segunda atitude que nos faz “eficientes testemunhas” é a prática diligente da proclamação do Evangelho. A expressão “testemunhar” tem o sentido de “falar o que se viu”, “o que se sabe”, “do que se teve real experiência”, do que se tem convicção. Vivo exemplo disso encontramos em Atos 4:18-20 onde se registra a resposta peremptória dada por Pedro e João ao Sinédrio, que lhes ordenava que não falassem, nem ensinassem em o nome de Jesus: “não podemos deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos”. E não se calaram mesmo! A missão de proclamar o Evangelho é irrecusável na atuação do verdadeiro discípulo.
Se aprendermos as “verdades evangélicas”, que tanto nos valem espiritualmente, não há como silenciá-las e deixar de proclamá-las àqueles que ainda não as conhecem. Não estaremos cumprindo a nossa responsabilidade como igreja e como cristãos, individualmente, negligenciando nessa importante área de nosso “testemunho”. A ênfase que o Senhor Jesus deu, ao nos atribuir essa inescusável responsabilidade perante o mundo, “tem caráter imperativo”. Disse: “ide”; “fazei discípulos”; “pregai” (Mateus 28:19; Marcos 16:15); “sereis minhas testemunhas” (Atos 1:8). O apóstolo Paulo se declara exemplo vivo dessa irrecusável atitude do verdadeiro cristão: “Se anuncio o Evangelho, não tenho do que me gloriar, pois sobre mim, pesa essa obrigação; porque ai de mim se não pregar o Evangelho” (1 Coríntios 9:16).
Há, pelo menos, três modos distintos pelos quais podemos cumprir a responsabilidade de “testemunhar do Evangelho no mundo”:
1 - Através do “evangelismo público”, aquele que é dirigido às massas. É praticado, em geral, nos cultos normais, em templos e em lugares próprios para grandes auditórios, através de campanhas especiais promovidas pelas igrejas locais. Bom é que seja praticado com amor e interesse real pela salvação dos pecadores perdidos, para que não resulte infrutífero. Devem os cristãos dar o seu suporte em oração pelos que pregam e pelos que ouvem a mensagem, bem como devem procurar trazer para esses ambientes coletivos os que ainda estão sem a Salvação.
2 - Através do “evangelismo missionário”, realizado pela atuação de missionários enviados a espaços terrestres muitas vezes longínquos, para alcançar povos e culturas sem o testemunho do Evangelho. O envio e a sustentação de missionários, bem como o acompanhamento do seu trabalho no campo em que se encontram é, precipuamente, responsabilidade da igreja local. Não é, nos dias que correm, praticado com a força e amplitude de outros tempos. Os cristãos, que não se sentem chamados para irem, devem participar desse tipo de ação evangelística missionária com o seu útil suporte de intercessão e financeiro. Quem não vai, manda!
3 - Através do “evangelismo pessoal”, pela prática do testemunho pessoal do Evangelho que incumbe a cada cristão fazer, nos espaços terrestres que ocupa, aos que nesse espaço venham a se encontrar, sem qualquer preconceito ou discriminação. Creio ser o mais eficiente meio de evangelização, como provam à saciedade, os abundantes resultados alcançados no curso do tempo. Esse eficiente método de evangelismo tem sido utilizado desde o início da Igreja e em muitos períodos áureos da sua história, marcando os melhores momentos do seu notório progresso. Lamentavelmente, tem sido deixado de lado, sendo, a meu ver, uma das razões do reduzido progresso na atuação evangelística atual. É porque exige, de cada cristão, consagração, porte espiritual, íntima e permanente comunhão com Deus e com o Seu povo, aplicação séria no exercício da oração, santidade prática evidente e constante, consciência de responsabilidade evangelística, testemunho correto em todas as áreas da vida, paixão pelas almas perdidas. Exige, ainda, aplicação esmerada na busca e aproveitamento de oportunidades e na criação de pontos de contato.
Infelizmente há muita carência dessas qualificações espirituais no porte dos cristãos dos nossos dias. Na vida eclesiástica a disciplina é negligenciada, o comportamento espiritual é marcado pela indolência para com os princípios cristãos válidos, constantes da Palavra de Deus. Há pouco interesse nas coisas de Deus. Igrejas que mais parecem clubes do que igrejas, preocupando-se com atividades afins, não especificamente de nível espiritual, que pouco ou nada têm a ver com o projeto de Deus para a Sua amada Igreja. Esse contexto negativo da Igreja resulta na inibição dos cristãos para a prática do eficiente “evangelismo pessoal”, anulando, consequentemente, o progresso da Igreja nos nossos dias.
Foi o “evangelismo pessoal” que deu vertiginosa e ampla expansão ao cristianismo nos primórdios e no curso da sua história. Veja Atos 5:42; 8:1,4,5; Atos 11:19-20. O expressivo resultado dessa atuação evangelística pessoal foi o surgimento da primorosa igreja em Antioquia, onde os discípulos, pela primeira vez, foram chamados cristãos (v. 26), e de onde teve início a extraordinária e abençoada atuação missionária do apóstolo Paulo (Atos 13:1).
Creio que é tempo de a Igreja reverter o quadro de indolência, negligência e desinteresse pelas almas perdidas, empenhando-se, através da atuação eficaz de todos os seus membros, no frutífero trabalho de “evangelismo pessoal”.
3. O VIVER
A terceira atitude que nos faz “eficientes testemunhas” é a maneira como vivemos no mundo. Já vimos que ser cristão é ser uma nova criatura, isto é, ser diferente da velha criatura; e que as coisas velhas devem passar; devem se fazer novas. A eficiência do nosso testemunho não acontece só porque dissertamos bem sobre o conteúdo do Evangelho, mas pelo que mostramos desse conteúdo em nosso procedimento diário. A nossa vida é a melhor ferramenta para partilharmos o amor de Deus. O viver fala mais alto do que as palavras!
A contradição entre o falar e o viver anula totalmente a eficácia de nosso testemunho. Existe alguma verdade bíblica que não estou obedecendo? A minha vida particular é condizente com o que prego e ensino? É fundamental refletirmos sobre isso! É nossa responsabilidade evidenciar, pela nossa vida, tudo o que falamos aos outros sobre as verdades evangélicas. Só assim os que nos ouvem podem ser afetados profundamente por elas, impressionados muito mais por verem-nas expostas praticamente em nosso procedimento cristão. O impacto das palavras é tênue e agita a mente. O impacto das verdades evangélicas, constatadas no nosso viver diário, afetam positiva e profundamente a alma, estimulam a emoção e levam à necessária convicção daqueles que queremos alcançar para Cristo. Nesta hipótese, o Espírito Santo atua fortemente, através da constatação que o evangelizado faz, inequivocamente, da atuação efetiva do poder do Evangelho, transformando, radicalmente, o nosso viver.
A expressiva metáfora que o Senhor Jesus usou em Mateus 5:14-16 torna-se pertinente e preciosa lição: “Vós sois a luz do mundo... Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus”. Esta é uma das mais importantes declarações do Senhor a respeito da manifestação da vida cristã, pois define a vontade de Deus quanto ao porte cristão no cenário do mundo. No contexto, em Lucas 14:25-35, verifica-se que esta declaração do Senhor segue, imediatamente, à definição do verdadeiro discípulo. Esse ensino dado pelo Senhor sintetiza tudo o que Ele espera do verdadeiro cristão, para que o seu testemunho tenha valor e eficácia.
O homem natural está em trevas (João 3:19). A luz que o Senhor menciona que devemos manifestar não é “luz própria”, mas “luz refletida”. Paulo ensina: “todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito”. Em João 8:12 afirmou o Senhor: “Eu sou a luz do mundo, quem me segue não andará em trevas, pelo contrário terá a luz da vida”. Ao afirmar “quem me segue” refere-se ao verdadeiro discípulo. A luz advém do Senhor Jesus, porque Ele é luz e vida, e só o verdadeiro discípulo poderá ter dEle “a luz da vida”. A mesma ideia vemos em João 1:4... “A vida estava nele e a vida era a luz dos homens”. Essa luz só é alcançada mediante o Evangelho que aceitamos (2 Timóteo 1:10; 1 Pedro 2:9).
Só os que têm a nova vida em Cristo podem manifestar a luz. Para refletirmos essa luz através de nosso viver diário, precisamos estar ligados à fonte de energia, que é Ele, para, por Ele, sermos continuamente alimentados da mesma. Sujeira na lâmpada diminui o seu brilho e prejudica a luminosidade necessária! Curto-circuito na ligação apaga o brilho da lâmpada! A sujeira e o curto-circuito do pecado prejudicam a manifestação da luz que o Senhor quer ver em nosso viver, para afetar, favoravelmente, o mundo. Este jaz no maligno (1 João 5:19). Ama mais as trevas do que a luz, porque as suas obras são más (João 3:19). O que o Senhor pretende de nós, como “filhos da luz”, é que afetemos positivamente o mundo, com o brilho da nossa luz, que emana dEle, para mudar a sua atitude para com Ele (“brilhe também a vossa luz diante dos homens para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus”).
O resultado há de ser a glória dada a Deus pelos homens, que devem ver as nossas boas obras, ou seja, o brilho da nossa luz, que é o nosso viver, na plena vontade do Senhor. Importa muito mais, com o testemunho nosso, que o mundo veja aquilo que ouve. O que se expõe não se pode esconder (v.14b); o que se esconde não se pode ver (v. 15). Neste passo, vale lembrar o que nos ensina a Palavra de Deus sobre o viver cristão, adotando o verbo andar no sentido simbólico de “manifestação de caráter”.
Conclusão – Busquemos cumprir, eficientemente, a nossa responsabilidade de fiéis “testemunhas” do Evangelho perante o mundo, através da “instrução”, da fiel “proclamação” e pelo nosso viver.