“E, assim, se alguém está em Cristo é nova criatura;
as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas”
2 Coríntios 5:17
Vivenciou nestes últimos dias o tradicionalmente chamado mundo cristão uma intensa agitação motivada pela renúncia de um papa e a eleição de outro, para ser o chefe terrestre supremo da chamada igreja cristã. Experimentaram os povos de muitas nações no mundo, nas mais diversas áreas de sociedade nacional, momentos de grande comoção. Todos os meios de comunicação priorizaram o fato, dando-lhe destaque inusitado.
As personalidades mais ilustres se manifestaram com opiniões e palpites, os mais contraditórios. Contemplando tudo isso fiquei a pensar até que ponto essa agitação histórica tem a ver com o propósito de Deus para o cristianismo autêntico. Todo esse intenso movimento levou em conta mais a robusta e grandiosa organização religiosa denominada Igreja Católica, de conotação notoriamente humana e nunca espiritual. Um tremendo jogo de interesses pessoais, na disputa de poder secular, de projeção clerical, de controle financeiro da robusta banca monetária de propriedade da igreja etc., motivou intrincados procedimentos políticos e de outras ordens, muitas vezes adotados sem o menor escrúpulo, pouco compatíveis com a ordem espiritual, moral e a decência.
Na verdade o foco não é o “cristianismo”, na sua correta concepção e finalidade bíblicas, mas o movimento temporal de uma poderosa organização humana, enganosamente chamada de “igreja cristã” a serviço dos interesses, muitas vezes escusos, dos que a controlam e dirigem.
Por isso, julgo oportuno considerar o “conceito bíblico de um cristão autêntico”. O texto acima de Paulo (2 Coríntios 5:17) está, apropriadamente, no contexto posterior da passagem na qual o apóstolo trata do Tribunal de Cristo, que deverá, no tempo de Deus, avaliar e julgar o que cada cristão tiver feito aqui, “para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo” (2 Coríntios 5:10). Os cristãos serão julgados segundo uma retrospectiva de suas obras, com o propósito de se lhes conceder galardões ou receberem a reprovação do Senhor.
Em Romanos 14:10, afirma Paulo, “todos compareceremos perante o Tribunal de Cristo”. Portanto, o “cristão” dará contas ao Senhor pelo que tenha sido e pelo que tenha feito no mundo. Essa responsabilidade advém do fato inexorável de ser ele “nova criatura”. Deve, por isso, manifestar nova vida, um novo modo de proceder, compatível com a condição de “cristão”, deixando para trás as coisas antigas, inerentes à velha natureza.
- O que é ser cristão?
Ser cristão implica em ser “diferente” do homem natural, aquele que ainda não nasceu de novo. Uma manifesta e indisfarçável postura perante o mundo, a de “nova criatura”, em contraste com a postura do “homem natural” (a velha criatura). É a postura de quem possui a “nova vida”, obtida pela fé (João 1:12), na Pessoa, na Palavra e na Obra do Senhor Jesus Cristo. Resulta, pois, de um “novo nascimento” (regeneração), operação de caráter espiritual, não natural, pela atuação da Palavra crida (Romanos 10:17; 1 Pedro 1:23) e do Espírito Santo, que convence o pecador do seu pecado, da Justiça e do Juízo (João 16:8).
O batismo nas águas simboliza bem esse fato, como vemos em Romanos 6:4... “fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo, para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos, pela glória do Pai, assim também andemos nós em novidade de vida”. O Senhor Jesus Cristo enfatizou essa verdade falando a Nicodemos, quando lhe disse ser necessário “nascer de novo”, pois quem não nascer da água (a Palavra) e do Espírito não pode “ver” o reino de Deus; não pode “entrar” no reino de Deus (João 3:5- 8). Faz-se imperioso o novo nascimento, o qual nada tem a ver com o processo natural da geração humana, já que a “nova vida” resulta de um processo eminentemente espiritual.
Paulo, enfaticamente, afirma que somente aquele que está em Cristo “é nova criatura”. Isso implica, necessariamente, em que tudo se faça novo, todas as coisas velhas já passaram (as que consistem na vivência do homem natural, isto é, sem Cristo). Tudo se fez novo, diz Paulo, porque a vida do homem espiritual (aquele que é nascido de novo) deve ser diferente da que tinha antes do novo nascimento. O seu comportamento, agora, não pode ter nada a ver com o da velha criatura. A mudança deve ser radical e deverá ser, inevitavelmente, notada pelos que não são cristãos.
2. Como tornar-se cristão?
É o exercício da fé que viabiliza a conquista, pelo pecador, do benefício incomparável da “nova vida”, e de todos os demais benefícios que dela advém, no usufruto do maravilhoso processo da SALVAÇÃO. Lemos, em Hebreus 11:6, que “sem fé é impossível agradar a Deus”.
Mas há mais duas expressões, de sentido fundamental para a correta realidade cristã, que definem o processo do verdadeiro “novo nascimento”: “arrependimento e conversão”. Ninguém se tornará um cristão autêntico, uma “nova criatura”, se não se arrepender dos seus pecados e se não se converter ao Senhor. Foram as expressões chaves usadas pelos apóstolos, para definirem a atitude indispensável do velho homem, a fim de se tornar uma nova criatura.
Tais expressões fundamentaram o surgimento da Igreja de Cristo na terra. “Arrependimento” é o que proclama Pedro ser indispensável na atitude do pecador, como resposta única e adequada à solução do dramático problema que o pecado trouxe à criatura humana. Fê-la no final da sua notável pregação, que alicerçou a edificação do corpo de Cristo (Atos 2:38). O próprio Pedro reafirma esse fundamento da nova vida em Cristo, em Atos 3:19... “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados”. Não foi outra a mensagem do Senhor Jesus no início do seu ministério (Marcos 1:15).
O problema do ser humano tem sido o pecado, que afastou de Deus o homem, anulando os seus valores morais e espirituais e qualquer possibilidade de ser ele, como Deus queria, instrumento da realização dos Seus propósitos soberanos no mundo. O pecado se tornou na maior tragédia para o homem no mundo! Isaías 59:2... “as vossas iniquidades fazem separação entre vós e vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça”. Deus detesta o pecado, mas ama o pecador e, por isso, manifestou o Seu amor e a Sua misericórdia, através da Sua Graça, para restaurar o homem perdido (João 3:16; Efésios 2:4-5; Romanos 5:8; 8:1).
Sobre o Calvário o Senhor Jesus pagou a nossa conta, satisfez a Justiça divina, livrando-nos da condenação eterna dos nossos pecados, expiando-os no sacrifício solene do Seu próprio corpo, purificando-os através do sangue que ali, voluntariamente, derramou, sob tremendo e incomparável sofrimento. Esse foi o preço pago para a nossa Redenção (1 Pedro 1:18-20)! O sepulcro, onde O colocaram, Ele o deixou vazio, para nos garantir a ressurreição de nosso próprio corpo (1 Coríntios 15:13, 14, 16, 20). Aleluia!
O que nos resta fazer, pois, além do exercício da fé?
1. ARREPENDIMENTO sincero dos nossos pecados, confessando-os e deixando-os (Provérbios 23:18; 1 João 1:9). “Arrepender-se” significa: reconhecer o pecado; ficar triste e chorar, contritamente, pelo pecado cometido; confessar o pecado perante o Senhor; deixar o pecado. Não há como chegar-se à condição de “nova criatura”, sem o arrependimento sincero, que implica, necessariamente, nos passos acima referidos.
2. CONVERSÃO VERDADEIRA ao Senhor. “Converter” é mudar totalmente o rumo em que estamos, para adotar outro completamente diferente. A conversão ao Senhor dá-se, somente, quando nos dispomos a “mudar o rumo” desastrado que estamos seguindo, o da velha criatura, para adotarmos o “rumo novo”, o da “nova criatura”, que o Senhor nos indica. Seguir na “nova direção” que nos leva aos alvos de Deus e às indizíveis bênçãos que Ele nos reserva (João 14:6; Salmo 37:5; Provérbios 3:5-6). Essa é a atitude da qual resulta, também, o “novo nascimento” e a experiência da “nova vida” em Cristo. Digno exemplo dessa maravilhosa realidade cristã temos no que aconteceu com os “discípulos” na igreja de Antioquia (Atos 11:26). Foram lá eles chamados, pela primeira vez, “cristãos”, pela notável evidência das características da “nova criatura”, expostas, amplamente, na vivência diária no contexto do “mundo” local. Não precisaram declarar-se cristãos ou usar identificações formais. A designativa lhes foi atribuída, pelos do local, em razão do que neles viram, identificando-os, claramente, com o Mestre que pregavam, por e para Quem viviam! A diferença de postura foi patente a todos e, por isso, foram distinguidos com essa preciosa identificação. Eram, realmente, novas criaturas em Cristo!
Por isso o texto sagrado fala “os discípulos” foram, pela primeira vez, chamados cristãos. Eram discípulos verdadeiros. Eram “diferentes” dos outros! Portanto, “cristãos”! A nova criatura deve manifestar “vida nova”, “caráter novo”, “procedimentos novos”, “alvos novos”, enfim, “tudo novo”! Vale muito para nós o digno exemplo de Paulo: “para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro” (Filipenses 1:21). Jesus Cristo nos exorta: “Quem permanece em mim e eu nele esse dá muito fruto: porque sem mim nada podeis fazer” (João 15:5). Para sermos “diferentes” devemos assumir Cristo (“quem permanece em mim”) e Lhe dar espaço em nosso viver (“e eu nele”). A “diferença” do cristão, em relação ao homem natural, estará no “muito fruto” (“dá muito fruto”) que, inevitavelmente, terá que dar, na total dependência e atuação de Cristo, pois sem Cristo nada poderá fazer!
3. Quais os privilégios do cristão?
Pedro exalta, em 1 Pedro 2:9, os excepcionais privilégios que desfrutamos como “cristãos”, por sermos membros do corpo de Cristo, a Sua amada Igreja: raça eleita; sacerdócio real; nação santa; povo de propriedade exclusiva de Deus. Deus tem propósitos bem definidos para a Igreja, para cada cristão, como membro do corpo de Cristo. Fomos chamados das trevas para a Sua maravilhosa Luz, como povo de Deus que agora somos. A nossa vocação está bem explicitada: “A fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou para a sua maravilhosa luz”. Que maravilhoso privilégio é esse!
Conclusão – A atitude da igreja tradicionalmente chamada cristã está largamente distanciada do conceito bíblico correto do autêntico cristianismo. Por isso age como organização humana a que, enganosamente, se denomina de igreja “cristã”. Que equívoco! Aproveitemos o momento histórico desse equivocado comportamento religioso para refletirmos sobre nossa condição de cristãos autênticos, lembrando o ensino de Paulo em 1 Timóteo 3:14-5... “Escrevo-te estas coisas... para que... fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da Verdade”.