1 Coríntios 15:12-19
No início do mês de novembro muitos choram entristecidos e com saudades dos queridos que já partiram. Torna-se oportuno lembrar, neste contexto, o ensino das Escrituras sobre a certeza da ressurreição dos mortos.
No texto, sob exame, Paulo procura argumentos fortes contra os que negavam que os mortos ressuscitarão. Sustentados pelo contexto grego, os convertidos gentílicos, na igreja de Corinto, não conseguiam crer na ressurreição dos mortos. Criam na imortalidade da alma, mas não na ressurreição do corpo. Para eles o corpo era a fonte de fraqueza e do pecado do homem; a morte, portanto, era o meio bem-vindo pelo qual a alma se libertava do corpo. A ressurreição, em seu pensamento, somente voltaria a escravizar a alma. Paulo deduz a conclusão lógica da posição deles: se os mortos não ressuscitarão, Cristo não ressuscitou, a fé cristã é vazia. Os opositores estão golpeando o âmago da fé. Se a ressurreição corporal de Cristo é inverídica, então a pregação do Evangelho é uma farsa (v. 15), a fé cristã não tem conteúdo significativo (v. 17), e os cristãos não podem ter esperança com respeito ao futuro (vs. 18-19).
O apóstolo considera uma variedade de circunstâncias ligadas à hipótese absurda de não haver a ressurreição dos mortos. Argumenta através de negativos:
1. O absurdo face à pregação do Evangelho (v. 12) – Paulo já argumentara que a ressurreição de Cristo é fundamental para o Evangelho. Vemos isto nos primeiros versos do capítulo, onde o sumário salienta a ressurreição de Cristo. Baseado nisso, como se negar a ressurreição de mortos (no grego, a expressão é “ressurreição de mortos”). Passa, então a enumerar consequências absurdas dessa posição negativa.
2. A negativa resulta no absurdo da não ressurreição de Cristo (vs. 13 e 16) – A bem-aventurança de haver um Salvador e Mestre vivo, presente e poderoso, fica sendo meramente um fato histórico passado, e o cristão terá abraçado a um defunto! Se os homens, em geral, não ressuscitam, segue-se que Cristo não ressuscitou. Paulo reitera o argumento no v. 16, mudando a expressão “não há ressurreição de mortos” para “se os mortos não ressuscitam”. Ele quer que os seus leitores vejam as consequências lógicas da sua absurda posição.
3. A negativa resulta no absurdo de uma pregação vã (v. 14) – A expressão “vã” (gr=kenon) significa “vazio”. Se não há ressurreição por trás da pregação, esta, que como se demonstrou, não foi pregada só por Paulo, mas por todos os apóstolos (v. 11), não tem conteúdo nem substância. É a ressurreição que mostra que Deus está na pregação e, se não houve ressurreição, então a coisa toda é um embuste. “Pregação” é, no original, “kerugma”, e denota o “conteúdo da pregação”, a coisa pregada, a mensagem, e não o ato de pregar. Perante a negativa da ressurreição dos mortos o Evangelho torna-se falso, porque afirma, como sua verdade central, a ressurreição de Cristo. Não pode haver um Evangelho sem um Salvador vivo!
4. A negativa resulta no absurdo de uma fé vã (vs. 14 e 17) – A fé cristã não abraça uma criança no colo de uma mãe, nem um mártir pregado numa cruz, mas um Salvador vivo à destra de Deus Pai. Paulo enfatiza, novamente, a expressão “vã”. A fé dos crentes em Corinto dependia do Evangelho, com base no qual ela surgira. Se esse Evangelho era uma impostura, então o era também a fé produzida por ele. Paulo reitera o argumento no v. 17, salientando que, no caso, a fé se torna vã, mas usando uma outra palavra no grego (“mataia”), que tem o sentido de “futilidade” ou “coisa infrutífera”.
5. A negativa resulta no absurdo de que todos os pregadores do Evangelho são falsos (v. 15) – Paulo afirma que, na hipótese sustentada por eles, “somos todos tidos por falsas testemunhas de Deus”. Todos os apóstolos foram mentirosos! A expressão “somos tidos por”, significa “somos apanhados”, ou, como o traduz Moffatt, “somos descobertos”. Todos os pregadores estão se demonstrando desonestos. Não tinham os pregadores simplesmente falado aos homens sobre uma boa maneira de viver, pois o cristianismo não é um sistema de bom aconselhamento. Tinham testemunhado que Deus ressuscitou a Cristo. Basicamente o cristianismo é um “Evangelho”, isto é, uma boa notícia do que Deus fez! A função dos pregadores é dar testemunho dos atos salvadores de Deus. Foi isso que os apóstolos fizeram, cumprindo ordens expressas do Cristo ressuscitado: “Vós sois testemunhas destas coisas” (Lucas 24:48) e “Sereis minhas testemunhas” (Atos 1:8). Os apóstolos tinham feito justamente isso. Tinham testificado que Deus ressuscitou a Cristo. Mas, se der por certo que os mortos não ressuscitam, é impossível que Deus tenha feito isso! Paulo usa a expressão: “temos asseverado contra Deus”, isto é, disseram que Deus fez uma coisa que Ele não fez!
6. A negativa resulta no absurdo de que não houve purificação dos pecados (v. 17) – Se Cristo não ressurgiu, não há como se provar que a Sua morte expiatória tenha sido suficiente para efetivar a purificação dos pecados, sendo certo que o salário do pecado é a morte! Noutra passagem Paulo fala de estar “mortos em pecados” (Efésios 2:1,5; Colossenses 2:13), e isto nos lembra das palavras do Senhor sobre morrer em pecados (João 8:21,24). Paulo já esclareceu que “Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras” (v. 3). Mas se os homens ainda estão nos seus pecados, esta morte de nada valeu. Cristo morto sem ressurreição seria um Cristo condenado, não justificado. Como poderia justificar outros? Nesse caso a fé é fútil. Pode-se, também, entender do argumento de Paulo, que estariam eles, ainda, vivendo em seus pecados, como qualquer pagão. Mas eles têm um novo poder sobre o pecado, poder proveniente da fé num Cristo que vive. Portanto, Cristo tem que ter sido ressuscitado.
7. A negativa resulta no absurdo do nosso perecimento eterno (v. 18) – Se os mortos não ressuscitam, os santos falecidos pereceram, acabaram, não existem mais senão na memória. É outra consequência da negativa absurda, que diz respeito ao destino dos que partiram. Poucas coisas são mais significativas no cristianismo primitivo do que o novo conceito da morte, novo conceito que o próprio cristianismo deu aos homens. Para os pagãos a morte é o fim de todas as coisas. É o adversário que por fim derrota todos os homens. Para os cristãos, não é mais do que um sono. Cristo arrancou dela o seu aguilhão (v. 55). Paulo podia falar da morte como “lucro” (Filipenses 1:23). Assim, quando os crentes morriam, não deviam ser pranteados como os irremediavelmente perdidos. Estavam com Cristo. Mas somente se houver ressurreição, insiste Paulo. Se Cristo não ressuscitou, então nem eles ressuscitarão. A expressão “pereceram” descreve, aí, o ato de cair no sono, como eles pensavam, em Cristo (veja 1 Tessalonissenses 4:13-18).
8. A negativa resulta no absurdo da nossa total infelicidade (v. 19) – Paulo afirma que “se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida” a nossa infelicidade é acima da que tem o homem mais infeliz do mundo! A vida fica sem sentido, sem orientação segura, sem esperança alguma. Somos “dignos de dó” (esse é o sentido no original). Essa lamentável situação refere-se não tanto à dureza da sorte dos cristãos, como a seu caráter como homens iludidos que merecem piedade. Puseram as suas esperanças num Senhor que há de trazer-lhes uma vida mais rica e mais completa e tudo que os distingue dos outros é uma forma especial de dureza (2 Coríntios 6:4 e seguintes; 11:23 e seguintes). Embora Paulo nunca despreze as compensações que os cristãos têm nesta vida no sentido de paz interior e coisas semelhantes, é questão de puro senso comum ver que, se este mundo é tudo que existe, ninguém está mais alienado do que o cristão.
Conclusão: Como afirma Paulo em 1 Tessalonicenses 4:11-12, não sejamos ignorantes com respeito aos quem dormem, para não nos entristecermos como os demais, que não têm esperança. Pois se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também Deus, mediante Jesus, trará, em Sua companhia, os que dormem.