A Responsabilidade do Cristão Perante o Mundo - 8

 “E, assim, se alguém está em Cristo é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas
” 2 Coríntios 5:17

Conferência proferida pelo irmão Jayro Gonçalves no Congresso das Igrejas dos Irmãos de Portugal em 17/04/2010

 

III - O MUNDO COMO SISTEMA PECAMINOSO – DEVEMOS REJEITÁ-LO, VIVENDO EM SANTIDADE

3. A santidade prática afasta-nos do sistema pecaminoso

A santidade é fundamental para que a Igreja exerça, com resultado eficiente, a sua gloriosa missão no mundo. É uma área, pouco levada a sério, nos dias de hoje, quando suportamos terrível pressão que o contexto em que estamos metidos nos impõe. A poluição moral do mundo é intensa e afeta, seriamente, a santidade necessária da Igreja, através de todos os meios de informação disponíveis.

Paulo, em Efésios 5:25-27, refere-se à Igreja dizendo: “Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela, para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra, para apresentá-la a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito”. A santidade é assunto muito importante em todas as Escrituras.

É mandamento inescusável do Senhor que devemos ser santos porque Deus é Santo, registrado tanto no Velho como no Novo Testamento (Levítico 11:44-48; 1 Pedro 1:14-16). “Deus é Santo, Santo, Santo...” (Isaías 6:3), e não usa os que não sejam santos! O desafio do Senhor, no Salmo 24:3-4, continua válido: “Quem subirá ao monte do Senhor? Quem há de permanecer no seu santo lugar? O que é limpo de mãos e puro de coração”.

1. O que santificação não é!

Afastamento de seres humanos (João 17:15) - O Senhor nos envia a pregar no mundo (Marcos 16:15). Não podemos viver isolados (1 Coríntios 5:9-10); temos que viver no mundo sem sermos contaminados pelo mundo (João 17:15; 1 João 2:15-17).

Conformação com certo padrão de vida (Colossenses 2:16-23) - O budismo, o confucionismo e outras ideologias ou formas religiosas consistem em doutrinas com conteúdo filosófico moralista, mas nem por isso são santas consoante o conceito bíblico de santidade.

Abstinências de certas comidas ou bebidas - Obediência às regras ou ritos de formalismo religioso (Gálatas 4:8-10; 6:15). A fonte de santificação do cristão não é o “legalismo”! Paulo condena os ensinadores falsos que querem impor à igreja regras e regulamentos que não conduzem à santificação (Colossenses 2:8-15).

Manifestações ruidosas ou emotivas e beatices - Consoante se constata em 1 Tessalonicenses 4:1-7, a santificação tem a ver com a nossa postura ética, moral e espiritual (condições do “ser” interior) e não com as levianas e até hipócritas manifestações exteriores de religiosidade vã, flagrantemente contraditórias com a nossa postura de vida diária. Essa falta de autenticidade não condiz com a necessária santidade.

2. O que é santificação?

No seu sentido primário a santificação consiste em “separação” e “dedicação”. “Separação” de tudo o que é comum e profano (mundano). “Separação” para Deus, o que significa “dedicação”. Alguns exemplos históricos referentes ao povo de Israel: dias (Deuteronômio 5:12); casas ou campos (Levítico 27:14-22); objetos (Êxodo 29:37; Deuteronômio 30:25-29); pessoas ou animais (Êxodo 13:2; 29:44; Levítico 11:43-45). O ato de separar exige, necessariamente, purificação. Esse conceito primário da santificação tem aplicação clara na experiência da santificação do cristão.

Deus quer que o cristão seja absolutamente separado do pecado (2 Coríntios 7:1) e de toda a forma de mal e, ao mesmo tempo, que cada um seja um vaso de honra apropriado para o Seu uso e a realização plena da Sua soberana vontade (2 Timóteo 2:21; Romanos 12:1-2).

No sentido posicional todo o verdadeiro cristão é santo de Deus. Destacamos alguns aspectos da santificação posicional: É ato soberano de Deus, mediante a obra de Cristo (Hebreus 10:9-10); o cristão verdadeiro é santificado em Cristo (1 Coríntios 1:2); o cristão verdadeiro é santificado por vocação divina (Romanos 1:7; Hebreus 3:1); a santificação posicional independe de nossas falhas ou imperfeições pessoais (1 Coríntios 3:1-3, conforme 6:11). Isso não significa liberdade para andarmos como queremos, há necessidade da santificação prática.

No sentido prático, a santificação é resultante da operação constante da Graça de Deus na nossa vida (1 Tessalonicenses 4:1-7), quando lhe abrimos espaço para uma verdadeira e efetiva experiência da plenitude do Espírito Santo (Efésios 5:8). Em 1 Tessalonicenses 4:1 Paulo usa a expressão “continueis progredindo cada vez mais”, o que nos leva a perceber o aspecto progressivo da santificação, que é operada pela graça do Senhor, mas que implica, necessariamente, na nossa disposição de vontade e atitude sincera de permissibilidade da ação do Senhor, operadora da santificação. Paulo fala também nesse texto da relação da nossa santificação com a “vontade de Deus” (v. 3).

Somos chamados para a santificação prática (também chamada de “santificação progressiva”). A santidade prática é que nos afasta do sistema pecaminoso e é operada, eficientemente, através das seguintes atitudes seriamente adotadas pelo cristão: pela busca de progressiva manifestação de semelhança a Cristo (2 Coríntios 3:18); pelo andar humilde, obediente e agradável a Deus (Filipenses 2:5-8; 1 Tessalonicenses 4:1); pela obediência à Sua Palavra (João 17:17; 1 Pedro 1:14-15, 22, 25); pela atitude constante e eficiente da separação do pecado e da rendição pessoal, integral e incondicional a Deus, para a realização da Sua vontade (Romanos 5:11-14, 19-22; 12:1-2); pela ocupação pessoal com o Senhor (2 Coríntios 3:18 conforme João 16:26; 16:13-14).

4. A responsabilidade da igreja ou do cristão perante o mundo para repulsar o seu sistema pecaminoso

Vamos considerar três atitudes essenciais para o efetivo cumprimento da responsabilidade de repulsa frontal ao mundo, como sistema pecaminoso:

1. Não amar o mundo - Lemos em 1 João 2:15-17... “Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo. Ora, o mundo passa bem como a sua concupiscência, aquele, porém, que faz a vontade de Deus permanece eternamente”.

O mundo é o sistema organizado e dirigido por Satanás, caracterizado por rejeitar a Deus e opor-se a Ele. Embora Deus ame o mundo no que diz respeito aos seres humanos (João 3:16), os cristãos não devem amar aquilo que leva os seres humanos a organizar-se contra Deus (1 João 5:19; João 3:10; Tiago 1:27; 4:4). Quem ama o mundo manifesta clara ausência do amor do Pai nele, o que o torna vulnerável ao seu envolvimento com o sistema satânico. O amor ao mundo, como sistema pecaminoso, designa, de maneira especial, os que se opõem à vontade de Deus (v. 17) e inclui todas as realidades que podem fazer com que as pessoas se afastem de Deus.

O texto distingue três modos diferentes de envolvimento com o amor ao mundo: 1. Concupiscência da carne, aquilo que tem por base a nossa natureza pecaminosa, voltada totalmente para as coisas da “carne” e não do “Espírito”. É o desejo de “fazer” o que apetece à carne; 2. Concupiscência dos olhos, aquilo que, com frequência, conduz à ganância e à cobiça, o desejo de “ver” que estimula a prática pecaminosa; 3. Soberba da vida, que é a presunção, a ostentação ou a vangloria em relação aquilo que se possui. O termo grego aí traduzido por “vida” também pode ser traduzido por “riquezas”, referindo-se aos bens materiais e a tudo aquilo que pode dar lugar à ostentação e ao orgulho. É o desejo desmedido de “possuir”.

Não amemos o mundo, como sistema pecaminoso organizado e agilizado ardilosamente por Satanás, repulsando-o, firmemente, pela prática constante da santidade.

2. Não se conformar com o mundo - Paulo nos exorta, em Romanos 12:1-2... “Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”.

Esse notável apelo à consagração de vida é dirigido aos cristãos (como também se vê em 1 Coríntios 6:19-20 e em Tiago 4:7), “pelas misericórdias de Deus”, que é tudo o que ele expôs nos capítulos anteriores da epístola. A expressão ”apresenteis” refere-se a uma decisão categórica (veja Romanos 6:13) e se constitui em atitude fundamental e indispensável para a experiência de uma vida santificada, repulsiva do sistema pecaminoso gerido por Satanás. A expressão “sacrifício vivo” é usada em contraste com os sacrifícios dos animais mortos e demonstra a importância e o alto valor da atitude a ser assumida pelo cristão. A expressão “culto racional” tem o sentido de “inteligente”, “sensato” e “ponderado”.

O alvo do texto é o de levar o cristão a não se conformar com o mundo, como sistema pecaminoso. A expressão “não vos conformeis” significa não viver de acordo com o estilo ou a tendência da era presente. A única outra ocorrência da expressão grega no Novo Testamento se encontra em 1 Pedro 1:14, onde o apóstolo exorta a não nos amoldar às paixões tidas anteriormente, na ignorância.

A expressão “transformai-vos” refere-se a um contínuo processo de mudança, que ocorre de dentro para fora. Essa mesma palavra é usada para a transfiguração de Cristo (Mateus 17:2) e, também, em 2 Coríntios 3:18, referindo-se à nossa transformação de glória em glória, ou seja de um grau de glória para outro superior, como resultado de nossa contemplação constante da glória divina de Cristo. A “mente” deve ser o centro dessa transformação, como se vê em Efésios 4:23 e em 2 Coríntios. A expressão “experimenteis” tem importância fundamental no texto, pois define o resultado abençoado do cristão que não se conforma com o mundo. Tem o sentido de “averiguação”. A dedicação dá ao cristão a capacidade de discernir a vontade de Deus, que é o resultado final de não se conformar com o mundo.

Não nos conformemos com o mundo, como sistema organizado e agilizado por Satanás, repulsando-o, firmemente, na prática constante da santidade.

autor: Jayro Gonçalves.