A questão de se detectar a nossa identidade como igreja tornou-se muito complicada ultimamente. Muitos dos nossos irmãos ficarão embaraçados se forem questionados sobre “o que nos identifica como igreja”. Isto, entretanto, não acontecerá com certeza, com 90% dos seguidores de alguma denominação ou seita em nossos dias.
Ao iniciarmos um diálogo com alguém, e esta pessoa nos questiona sobre a guarda do sábado, afirmando que este é um mandamento negligenciado pela maioria das denominações, imediatamente a identificamos: é um adventista.
Em outro caso onde há um debate sobre a obra da salvação e dentre aquelas pessoas alguém insiste na soberania de Deus em eleger e predestinar alguns para vida eterna e rejeitar outros, abandonando-os para a perdição, logo, sem dificuldades, o identificamos: é um calvinista, talvez um presbiteriano.
Se alguém é encontrado falando entusiasticamente sobre o agir sobrenatural nas curas, dons de línguas, revelações etc., temos certeza: é um pentecostal.
Ao sermos chamados em nosso portão por um casal, muito bem trajados, e que nos anuncia a proximidade do reino terreno de Jeová, negando a esperança do arrebatamento, negando com veemência a futura destruição dos céus e da Terra, como também a existência do inferno, já sabemos quem são: testemunhas de Jeová.
Com certeza, não teremos dificuldades em identificar também um batista fundamentalista pela sua firmeza em defender várias doutrinas bíblicas as quais domina muito bem; um católico romano pelo seu apego a Maria e a pessoa do Papa; um mórmon pelo seu uniforme e pelo seu belíssimo templo.
E quanto a nós? Como somos identificados? O que pregamos? Qual nossa característica? O que cremos? O que defendemos? De que nós zelamos? Por qual causa damos a vida? Do que não abrimos mão? De que temos “ciúmes”?
Se pedirmos a um adventista que deixe a doutrina sabática, mesmo que por amor à unidade do corpo de Cristo, ele jamais fará isto, ficará bravo. Se rogarmos ao calvinista que abra mão da sua interpretação sobre a predestinação, ele se negará com todas as suas energias. Lembro-me de um deles que me afirmou um dia: “ou eu vivo isto (o calvinismo), ou vou para o mundo!” Se sugerirmos ao pentecostal a necessidade de deixar os movimentos carismáticos de cura, línguas, revelações, certamente receberemos uma tremenda bronca e talvez percamos a sua amizade; se afirmarmos a um testemunha de Jeová a realidade do inferno eterno, a esperança do arrebatamento, a Divindade do Senhor Jesus, seremos rechaçados como hereges, se lhe oferecermos alguma literatura serão destruídas conforme a ordem da sua liderança. Por que tais pessoas normalmente reagem assim? Porque aprenderam a amar as suas doutrinas, suas convicções, as quais defendem com unhas e dentes. Eles têm zelo, ciúmes por aquilo que lhes é próprio. Eles possuem posição! Identidade!
E QUANTO A NÓS?
Parece que muitas das igrejas do nosso contexto estão sendo formadas por pessoas que não têm posição definida, que não possuem convicções próprias, mas que estão abertas à comunhão com qualquer pessoa que se diga cristã. Estamos abertos para adotar convicções e posições de outros. Não temos a nossa própria posição. Isto tem sido apregoado como “amor fraternal” e até mesmo tem sido dito que esta foi a prática dos chamados “Irmãos” do século XVIII.
Aliás, abro aqui um parêntese para perguntar ao querido leitor: Conhece a história dos “Irmãos”? Tem pesquisado seriamente este assunto? Quantos livros já leu sobre o assunto? Tem procurado conhecer os vários lados da história? Ou só conhece de ouvir falar?
Alguém já disse que aqueles que não conhecem a história estão condenados a repeti-la. Outro disse que: Quem aprende com os próprios erros é inteligente, mas quem aprende com os erros dos outros é sábio.
Uma pesquisa séria sobre os “Irmãos” revelará os seus acertos e os seus erros no passado. Pretendo citar apenas alguns acertos destes irmãos que foram guiados unicamente pelo Espírito Santo e as Escrituras quanto às suas posições:
Aqueles irmãos inicialmente começaram a se reunir para estudar livremente as Escrituras e, consequentemente, após algum tempo ABANDONARAM as suas denominações, para se reunirem apenas como “irmãos”. Naquele tempo RENUNCIARAM seus títulos como Bispo, Reverendo, Pastor, não abandonando, porém, o ofício, o serviço. Muitos deles, DESISTIRAM da ordenação oficial e também ABANDONARAM a filiação à alguma Junta Missionária, para terem liberdade de servir conforme orientação do Espírito Santo e desta forma RENUNCIARAM a um salário fixo, passando a depender do Senhor que os supria através das igrejas.
Aqueles irmãos NÃO ACEITARAM nenhum nome que os distinguissem dos demais cristãos, não concordaram com os apelidos que lhes foram dados (Irmãos de Plymouth, Irmãos Abertos, Darbistas), embora não pudessem evitá-los.
Aqueles irmãos adquiriram posições e convicções firmes, não porque quiseram unir os irmãos, não porque receberam uma revelação ou uma intuição, mas porque sinceramente e ardentemente, em oração, VOLTARAM ÀS ESCRITURAS.
Por causa desta volta às Escrituras, verdades básicas para a vida da Igreja que estavam esquecidas, ou desprezadas, foram trazidas de volta e o Senhor honrou a fé e busca destes irmãos naquele tempo, produzindo um avivamento em muitos países, resultando na expansão da pregação pura do Evangelho para muitas nações.
Se houve uma coisa que naquele tempo foi claramente notada foi a ausência de estratégia humana, engenhosidade, logística meramente humana. Não foi necessário lançar mão destas coisas, pois as suas CONVICÇÕES no poder da PALAVRA e atuação do Espírito Santo eram suficientes.
Voltamos à nossa pergunta: E quanto a nós, hoje? Temos Posições? Convicções? Se as temos, de onde elas vêm? Como se identifica um cristão que está associado a uma igreja neotestamentária? Se como cristãos neotestamentários temos convicções e posições claras, e são bíblicas, porque somos tão maleáveis? Tão tímidos? Por que nos envergonhamos delas? Parece que hoje não é ético ter posições, fincarmos marcos firmes, porque agindo assim estaremos ferindo outros irmãos, não estaremos agindo em amor fraternal, mas sim levantando barreiras na comunhão nas igrejas locais.
No entanto, ao lermos especialmente a 2ª carta de Paulo a Timóteo, encontraremos ali um apóstolo prestes a morrer, apelando a Timóteo, e a todos nós que mantenhamos os mesmos marcos que ele fincou, que mantenhamos as mesmas convicções e posições doutrinárias que ele ensinou a cada igreja, que não aceitássemos sob hipótese alguma o afastamento das doutrinas sãs que ele como apóstolo do Senhor estabeleceu para Sua Igreja.
Ele desafia Timóteo, e a todos nós, para ensinarmos decididamente as mesmas coisas que ele ensinou a outros homens fiéis, para que estes também ensinassem as mesmas coisas a outros. E assim, de geração em geração, isso mesmo que Paulo ensinou deveria ser passado sem alteração. Esta ardente exortação, deixada nas mãos de Timóteo, antes do martírio do dedicado apóstolo, devia-se ao fato de que nos últimos dias apareceriam homens egoístas, avarentos, mais amigos dos prazeres que amigos de Deus, que não fariam caso de muitas doutrinas apostólicas e introduziriam de maneira implacável um “evangelho açucarado”, um discipulado sem cruz, um cristianismo sem convicções, uma voz destituída de posições firmes, uma igreja maleável, conformada ao gosto humano.
Não é meu propósito neste pequeno artigo tratar dos posicionamentos doutrinários que todos nós deveríamos ter bem fundamentados na Doutrina dos Apóstolos, enraizados em nossa mente e coração, e que deveriam ser bem visíveis numa igreja que verdadeiramente possa ser considerada neotestamentária. Um estudo sobre estes pontos seria muito extenso e já existem muitos excelentes livros que tratam do assunto específico.
O meu desejo é que sejamos levados a uma séria reflexão sobre a nossa experiência como igreja não denominacional. Ou será que somos somente “mais uma boa denominação”? Se formos, somos uma denominação sem convicções, sem posicionamento? Deixe eu mesmo responder, sem demora: NÃO, mil vezes não! Não somos uma denominação! Não fomos chamados pelo Senhor a sermos somente mais um partido religioso a participarmos democraticamente da “divisão do seu corpo”.
O mundo não está precisando de mais uma denominação cristã, ele já as têm de sobra e está enojado, enfastiado delas. O que o mundo carece é ver mais uma vez uma igreja comprometida com o seu Cabeça “invisível”, mas que transmita a imagem de Cristo em sua forma de viver; e como ela faz isso? “Seguindo a VERDADE em AMOR” (Efésios 4:15). Praticando o equilíbrio entre VERDADE e AMOR. VERDADE: as convicções, posições doutrinárias, firmemente estabelecidas para serem obedecidas pela Sua Igreja; e o AMOR: aquele elemento que lubrifica estas verdades quando praticadas, quando seguidas, a fim de que não nos tornemos intolerantes e agressivos com estas verdades, que devem ser usadas para preservar a unidade do corpo de Cristo, e assim promover uma igreja estável, firme, unida, amorosa, fervorosa, que leva avante a propagação do poderoso Evangelho da Glória de Cristo, que produzirá novas criaturas, crentes possuidores de firmes CONVICÇÕES e ardente PAIXÃO.