A corda e o gargalo

Certa feita li uma crônica que relatava acerca da grande proeza de um equilibrista que fez a travessia das cataratas do Niagara empurrando, sobre uma corda bamba, um pesado carrinho de pedreiro cheio de cimento. Sem dúvida foi um grande feito dada a grande distância existente de um extremo ao outro, levando-se em conta as naturais dificuldades como a grande turbulência existente no vão livre daquela enorme queda d’água. Pela notoriedade da proeza houve grande cobertura da imprensa.

Ao completar a travessia, e nem ainda tinha retomado o fôlego pela conquista daquilo que muitos julgavam impossível de ser realizado, o equilibrista foi abruptamente abordado por um repórter que de imediato procurou entrevistá-lo a fim de conseguir uma reportagem em primeira mão e enaltecer o realizador de tão grande façanha.

Durante a entrevista o equilibrista procurou demonstrar a confiança que tinha naquilo que realizava, e para provar isso convidou aquele repórter para retornar com ele para a outra extremidade, só que agora o entrevistador seria a carga que iria no carrinho de mão. O repórter, apavorado com aquela hipótese, retirou-se desaparecendo no meio da multidão.

Como se vê, uma coisa é falarmos da possibilidade de algo que pode ser realizado e outra coisa bem diferente é crermos na pessoa que irá executá-lo. Aquele repórter acreditava no fato, mas não tinha total confiança naquele que efetuava o ato.

De certa forma podemos afirmar que isso também ocorre com respeito à obra missionária. Muitos estão dispostos a falar, a escrever, mas na hora de “correr o risco” acabam demonstrando extrema fraqueza por absoluta falta de confiança nAquele que disse para que não nos entregássemos às inquietações desta vida porque o nosso Pai sabe de todas as nossas necessidades e Ele Se agradou em nos dar o Seu Reino (Lucas 12:29-32).

Louvo a Deus por aqueles que aceitam o desafio, que para muitos é uma “corda bamba”, e se lançam confiantes na carreira que o Senhor lhes tem proposta e, pela fé, sem darem conta às naturais inquietações, fazem a travessia do seu consagrado ministério, simplesmente pelo fato de terem a coragem de viver pela fé, não por depositarem sua confiança nos homens ou nas instituições humanas, mas somente no Consumador e Autor da nossa fé, o Senhor Jesus.

Por sua vez, aqueles, que não são chamados para essa “travessia”, têm que viver na mesma confiança de que tudo que possuem provêm de Deus, pois nada que possuímos é nosso, mas dAquele que nos outorgou graciosamente todas as coisas, juntamente com o Senhor Jesus, tendo em mente que somos apenas administradores daquilo que o Senhor colocou em nossas mãos.

É aí que a “corda fica bamba”! Pelo fato de se colocar a confiança nas incertezas da posse de recursos financeiros, quer sejam fartos quer sejam parcos, a grande verdade é que muitos se angustiam pela ansiosa solicitude da vida. Muitos pensam assim: “se eu abrir mão das minhas reservas materiais como ficará o meu amanhã quando eu não puder mais ajuntar”? Loucura, diz o Senhor Jesus, “de quem será o que tens preparado quando pedirem a tua alma, pois entesoura para si mesmo e não é rico para com Deus” (Lucas 12:20-21).

Fora do Senhor não há certezas nem recompensas! “Debaixo do sol” nem sempre o prêmio é dos mais ligeiros, nem dos corajosos a vitória, nem dos sábios o pão, nem dos prudentes a riqueza, nem tão pouco dos entendidos o favor; porém tudo depende do tempo e do acaso, pois o homem não sabe a sua hora ou o tempo da calamidade que de repente cai sobre si (Eclesiastes 9:11-13).

Em Eclesiastes, o “Pregador” procura demonstrar o fracasso das tentativas de dar-se significado à existência humana pela experiência do materialismo, revelando as suas próprias experiências de que o trabalho duro também não traz satisfação. Mesmo que ele trabalhasse a vida toda e se esforçasse por conhecer e executar muitas coisas iria deixar tudo que ajuntou para alguém que talvez nunca tivesse trabalhado na vida! Isso além de ser uma tolice é injusto. O que é que um homem recebe como recompensa por toda a sua fadiga neste mundo? Muitas dores e tristezas, noites mal dormidas e cheias de preocupações. Que ilusão, que vida inútil, tudo é vaidade, é correr atrás do vento, assevera o sábio.

Quando ele descreve acerca da tentativa fracassada da experiência da fortuna ele conclui que quem ama o dinheiro dele não se fartará; nem o que ama a riqueza se fartará do ganho; também isto é vaidade (Eclesiastes 6:10). A avareza é de fato idolatria e é tão perniciosa como a prostituição, a impureza, a lasciva e o desejo maligno (Colossenses 3:5). Em sua suma conclusiva o “Pregador” conclui: “Teme a Deus, e guarda a seus mandamentos; porque isto é o dever de todo homem” (Eclesiastes 12:13).

Verdadeiramente devemos viver pela fé e não na “corda bamba” da flutuação dos recursos financeiros. Em nenhuma hipótese devemos depositar a nossa confiança na instabilidade da riqueza, mas em Deus que tudo proporciona para o nosso aprazimento, desde que pratiquemos o bem e sejamos ricos em boas obras, generosos em dar e prontos a repartir (1Timóteo 6:17-18).

Um exemplo notável dessa provisão lemos no capítulo 17 de 1° Reis, quando Elias compareceu à presença de Acabe, rei de Israel à época, e predisse perante o rei que haveria uma grande seca e nenhuma chuva ou sequer um orvalho haveria de cair naqueles anos do seu reinado.

Ora, a seca não faz acepção de pessoas, ela atinge os crentes e os incrédulos. Era mais do que evidente que Elias também seria atingido pela escassez que se avizinhava. Porém, ele confiava absolutamente nAquele a Quem servia. Veio-lhe a Palavra do Senhor dizendo para que se retirasse dali e fosse para junto da torrente de Querite, pois ele se manteria com aquela água e quanto à comida os corvos seriam ordenados para que o sustentassem.

De fato as suas refeições eram assiduamente servidas pelos corvos, que não falharam um dia sequer, e a água lhe era fresca e abundante. Enquanto ao seu redor a aflição era uma cruel realidade, lá estava ele no gozo das provisões de Deus. Porém, se ele confiasse tão somente naquilo que via, poderia ter uma grande decepção, pois, com o passar dos dias, aquela torrente secou porque havia tempo que não chovia sobre a terra.

Assim como ocorre com muitos em nossos dias, que ficam demasiadamente preocupados com a possibilidade da “seca do seu riacho monetário”, Elias poderia naquele momento entrar em desespero e se lamentar por não ter guardado o necessário para quando ocorresse aquela hipótese. Todavia, isso não aconteceria com ele porque ele se dispunha em ouvir e confiar no Senhor que, por Sua vez, deseja que Seus servos vivam exclusivamente e voluntariamente na Sua dependência.

Sem demora veio a Elias a Palavra do Senhor orientando-o para ir a Serepta onde uma mulher viúva lhe sustentaria. Eu fico a imaginar o que poderia ter passado em nossas cabeças naquele momento? Que condições haveria numa viúva pobre de sustentar alguém, pois, certamente, não tinha condições de sustentar a si própria ainda mais que uma enorme miséria estava instalada naquela região face ao grande período de seca.

Quando se confia no Senhor não se argumenta, se faz! Deus realizou ali um grande milagre, de porção dobrada, pois além de sustentar a Elias também salvou aquela pobre viúva e seu filho que certamente clamavam a Ele para que os acudissem naquele momento de grande dificuldade.

Uma vida de fé se debruça exclusivamente no compromisso e na comunhão que se tem com Deus. Quando Jesus e Pedro tiveram que pagar tributo e não tinham como pagar, Ele providenciou a provisão necessária através de um peixe; quando uma viúva estava prestes a vender os seus próprios filhos como escravos, por meio de Eliseu, Deus multiplicou o seu azeite pelo resto da sua vida; quando a viúva pobre colocou aquelas duas moedinhas, tudo que tinha, no gazofilácio do templo, certamente ela assim o fez porque cria nAquele que tinha o poder de abrir as janelas do céu e derramar bênçãos sem medida; quando nos inícios da igreja primitiva as necessidades materiais exacerbavam, surgiram servos como Barnabé que dispuseram em contribuir com liberalidade, generosidade e voluntariamente para que não houvesse falta de recursos para que aquela Obra se desenvolvesse e chegasse até nós e viéssemos a conhecer e a receber a Jesus como o nosso único, verdadeiro e suficiente Salvador.

Por certo você já tenha ouvido ou lido acerca da narrativa das duas garrafas com gargalos diferentes, que são usadas para ilustrar como Deus recompensa àqueles que são generosos para com a Sua gloriosa Obra, mas não custa repeti-la aqui. Imagine duas garrafas cheias de areia, uma de “gargalo largo” e a outra com “gargalo estreito”. Ao virar-se a de gargalo maior é evidente que o seu conteúdo irá se esvaziar mais rapidamente, ao passo que a de gargalo estreito irá escoar de forma mais “econômica”. Há quem afirme que a grande maioria dos crentes são de gargalo estreito, que de fato contribuem, mas não o fazem na abundância que o Senhor deseja.

Agora imagine o inverso! Reverta o processo e mentalize você colocando a areia de retorno às garrafas. Certamente a de gargalo largo irá se encher rapidamente, ao passo que a de gargalo estreito irá demorar demasiadamente e haverá grande desperdício, pois boa parte da areia cairá fora da garrafa e a operação terá que ser repetida várias vezes até que ela se encha por completo. Assim são as bênçãos do Senhor, àquele que dá liberalmente, abundantemente, ainda mais lhe será acrescentado, pois a alma generosa prosperará, ao passo que aquele que retém ou é moroso em dar, lhe será em pura perda, pois deixará de experimentar em sua vida o que o Senhor lhe tem preparado ainda neste presente século (Provérbios 11:24-25).

Amado irmão, a nossa vida deixa de ser uma “corda bamba” na medida em que confiamos exclusivamente no nosso Deus maravilhoso, que com Cristo nos dá graciosamente todas as coisas que precisamos (Romanos 8:32).

Sejamos, pois, como uma garrafa de “gargalo largo” para que a reciprocidade de Deus seja abundante em nossas vidas, não pense somente na “saída do gargalo”, mas confie na “entrada” que se torna abundantemente propícia na medida em que o “nosso gargalo” se torna largo. Sê, portanto, generoso em suas dádivas à gloriosa Obra do nosso Senhor, pois isso é aprazível a Deus. Permita Deus que assim seja!

autor: José Carlos Jacintho de Campos.