A caminho do Apocalipse 18 (1)

“Bem-aventurado aquele que lê, e os que ouvem as palavras desta profecia,
e guardam as coisas que nela estão escritas;
porque o tempo está próximo”

Apocalipse 1:3

 

Neste capítulo chegamos à metade do último grande parêntese que foi iniciado no capítulo anterior com o relato de João acerca da revelação do mistério que envolve a “grande meretriz”. Como vimos, essa personagem simboliza o sistema religioso mundano que prevalecerá neste mundo durante o tenebroso período da grande tribulação. Agora, neste capítulo, veremos a outra face desse sistema: o mercantilismo, coisa esta que já ocorre de sobejo em nossos dias por aqueles que se dizem cristãos. Tradicionalmente este capítulo é subdividido em três partes: 1. O anúncio da queda de Babilônia (vs. 1 a 8); 2. Os lamentos dos seus admiradores (vs. 9 a 20); 3. A ruína total dessa cidade impenitente (vs. 21 a 24).

 

A sequência do parêntese é rigorosamente sucessiva. Pela frase usada por João no versículo que inicia este capítulo – “depois destas coisas” – vê-se que o desenrolar dos acontecimentos aqui previstos sucedem imediatamente à destruição do grande sistema religioso revelado no capítulo anterior. Nesta visão João vê um magnífico ser angelical: Depois destas coisas, vi descer do céu outro anjo, que tinha grande autoridade, e a terra se iluminou com a sua glória” (v. 1). Face à autoridade que possui e o seu esplêndido resplendor há aqueles que exageram ao afirmarem se tratar do próprio Senhor Jesus. Segundo J. Allen, isso não faz o menor sentido, trata-se, portanto, de um erro de interpretação: “...mensageiros angelicais refletem a glória relacionada ao seu ofício na execução do plano divino, mas isto não deve ser confundido com a glória resplandecente que pertence, de forma inerente, ao próprio Cristo”.

 Diz o anjo a João: “Então, exclamou com potente voz, dizendo: Caiu! Caiu a grande Babilônia e se tornou morada de demônios, covil de toda espécie de espírito imundo e esconderijo de todo gênero de ave imunda e detestável, pois todas as nações têm bebido do vinho do furor da sua prostituição. Com ela se prostituíram os reis da terra. Também os mercadores da terra se enriqueceram à custa da sua luxúria” (vs. 2 e 3). Pera lá, a esta altura exclamará você! No último versículo do capítulo 17 é dito que a “meretriz” simbolizará a grande cidade que dominará sobre os governantes da terra, seria completamente consumida (17:16), e agora novamente é descrita a sua queda? São essas coisas, caro leitor, que fazem do Apocalipse um livro fascinante. Tenha sempre em lembrança que nele não existem incoerências, equívocos jamais, bastam paciência e dedicada meditação para entender todo o seu contexto.

 A imensa maioria dos comentaristas entende que o capítulo 17 trata do aspecto “espiritual” da Babilônia, e que o capítulo 18 diz respeito ao seu aspecto “mercantil”. Até aí é palatável essa interpretação, pois a figura da “grande meretriz” do capítulo anterior, juntamente com este, leva-nos a esse duplo entendimento de suas características: religiosa e comercial. De fato, esses dois capítulos apresentam um juízo duplo sobre essa “simbólica mulher”. O primeiro juízo já vimos (17:16), enquanto religião ela será massacrada por aqueles que anteriormente a apoiavam; agora veremos a queda da grande cidade que a “mulher” também simboliza – a nova Babilônia que será reedificada pela “besta” – e por certo será o centro comercial dominante do mundo à época.

 

É muito importante não nos esquecermos, nesse contexto, do “falso profeta”, apesar de não estar citado. Não convém isolá-lo desses últimos acontecimentos, pois certamente ele exercerá esse controle comercial, como já vimos no capítulo 13:16-18. Ele será o responsável pela inserção da “marca” naqueles que se curvarão à “besta”, ninguém negociará com o poder dominante se não estiver “marcado”. Portanto, o falso profeta terá duas características: a religiosa, como pseudomessias de Israel, e a comercial como o responsável pela política fiscal do tenebroso império satânico. Este importante detalhe tem passado despercebido por muitos, não se pode ter dúvida que o falso profeta terá intensa participação nesses acontecimentos. Como já vimos, quando do seu surgimento, ele não será mero figurante ou coadjuvante, erra quem assim pensar.

 Nessa visão parentética, o poderoso brado angelical – “Caiu, caiu, a grande Babilônia” –, é semelhante ao que lemos em Isaías 21:9, todavia lá o profeta está a se referir a invasão da antiga Babilônia por Ciro, ao passo que aqui o anjo se refere à Babilônia que será reedificada repentinamente pela “besta” no período da grande tribulação e, com a sua ruína, se tornará morada de demônios, covil de toda espécie de espírito imundo e esconderijo de todo gênero de ave imunda e detestável” (v. 2). É nesta nova Babilônia que se completa o vaticínio dos antigos profetas acerca desta terrível cidade, sobre a qual recairá a implacável ira de Deus, pois todas as nações têm bebido do vinho do furor da sua prostituição. Com ela se prostituíram os reis da terra. Também os mercadores da terra se enriqueceram à custa da sua luxúria” (v. 3). Diz J. Allen sobre isto: “Todos os demônios, todas as forças espirituais e tudo que o reino da natureza se rendeu a Satanás, serão agora, depois da destruição da cidade literal da Babilônia, confinados a este local, como uma prisão literal. O abandono deste lugar para os demônios e espíritos imundos é parte da sentença divina pronunciada contra Babilônia por Isaías: “Nunca jamais será habitada, ninguém morará nela de geração em geração... porém, nela, as feras do deserto repousarão, e as suas casas se encherão de corujas” (Isaías 13:19-22)”... um lugar a ser evitado durante a era milenar, como a prisão dos demônios”.

 No versículo 3 vemos os motivos para o terrível juízo de destruição dessa nova Babilônia. A expressão “todas as nações” dá a ideia da influência global que terá essa cidade. O mundo à época estará como que embriagado pelo furor da sua devassidão. Todas as nações serão seduzidas para o caminho da corrupção “espiritual” pela adoração que darão à “besta”, até mesmo por necessidade de sobrevivência (conforme capítulo 13:16-17). Por certo as teorias de conspiração serão por demais praticadas através de intrigas políticas de toda sorte, pois o poder central – da “besta” – será libertino, licencioso, traiçoeiro, onde a ética e a moral passarão ao largo.  Como vemos no texto, a excessiva luxúria praticada por essa nefasta cidade certamente contaminará o mundo todo e com isso os mercadores da terra se enriquecerão. No dizer popular, a coisa estará do jeito que o diabo gosta.

 A mudança da capital econômica mundial e o controle comercial centralizado na Babilônia que virá, é o cumprimento da profecia do “efa” de Zacarias 5:5-11. Segundo W. MacDonald, “a sétima visão de Zacarias mostra uma “mulher” sentada dentro de um efa, o maior recipiente comercial utilizado naquela época como medida de capacidade para cereais. A “mulher” apresentada é a personificação da iniquidade na terra. A tampa de chumbo sobre o efa sugere que a iniquidade era mantida sobre controle. Porém, outras duas mulheres levantam o efa e com ele foram para Sinar (que é a Babilônia). A visão está a indicar a transferência das religiões idólatras e mercenárias de Israel para Babilônia, seu local de origem, que vem representar uma etapa preparatória para o julgamento da Babilônia para o estabelecimento do Reino de Deus. Israel foi purificado da idolatria após o cativeiro babilônico, mas no futuro se envolverá com a idolatria muito pior quando adorar o “anticristo” como se fosse Deus”.

 A seguir João ouve outra voz dizendo: Retirai-vos dela, povo meu, para não serdes cúmplices em seus pecados e para não participardes dos seus flagelos; porque os seus pecados se acumularam até ao céu, e Deus se lembrou dos atos iníquos que ela praticou” (vs. 4 e 5). Por se tratar de um parêntese intercalado na sequência natural dos acontecimentos apocalípticos, este chamado para a retirada do povo de Deus, à época, provavelmente dar-se-á depois da destruição do sistema religioso que vimos no início deste grande parêntese, no capítulo 17, e imediatamente antes dos “sete flagelos” que serão derramados ao final do período da grande tribulação anunciado no capítulo 16. Sou levado a entender assim face ao anúncio transmitido: “para não participares dos seus flagelos”.

 Surge uma questão! Quem são esses que o Senhor estará a chamar e se encontram em meio ao devasso sistema neobabilônico? J. Allen dá o seu entendimento: “Podemos concluir por este chamado que haverá alguns verdadeiros cristãos, que embora recusassem o sinal da besta, residiam nessa cidade, ou pelo menos estavam associados, de alguma forma, com o império comercial da besta”. Pessoalmente entendo que pela ausência de uma revelação específica acerca do dia a dia daqueles que se converteram ao longo do período de tribulação, não cabe especular a respeito desse convívio, todavia o texto revela que pela convocação haverá aqueles que de alguma forma conseguirão subsistir, apesar de terem recusado a “marca da besta”, e não se envolverão com os “atos iníquos” ali praticados.

A réplica é chegada! Os agentes executores deste juízo de Deus recebem a ordem de execução: “Dai-lhe em retribuição como também ela retribuiu, pagai-lhe em dobro segundo as suas obras e, no cálice em que ela misturou bebidas, misturai dobrado para ela. O quanto a si mesma se glorificou e viveu em luxúria, dai-lhe em igual medida tormento e pranto, porque diz consigo mesma: Estou sentada como rainha. Viúva, não sou. Pranto, nunca hei de ver! Por isso, em um só dia, sobrevirão os seus flagelos: morte, pranto e fome; e será consumida no fogo, porque poderoso é o Senhor Deus, que a julgou” (vs. 6 a 8). A justiça de Deus é absolutamente perfeita e implacável. A depravação babilônica será retribuída de forma irreversível. O “cálice” da ignomínia com que ela corrompeu a humanidade agora terá um conteúdo diferente – a sua irremediável e dobrada condenação. Isto nos remete a Jeremias 50:29... “Retribuí-lhe segundo a sua obra; conforme tudo o que fez, assim fazei a ela; porque se houve arrogantemente contra o Senhor, contra o Santo de Israel”.

 Muitíssimos em nossos dias, inclusive cristãos, veem a Deus somente como alguém misericordioso, bondoso, com a obrigação de lhes dar saúde perfeita e prosperidade material. Todavia, se esquecem de que além dos Seus notáveis atributos Ele é absolutamente exigente em tudo o que diz respeito à transgressão aos Seus princípios. Os acontecimentos que aqui estamos vendo têm por objetivo nos trazer para perto de Deus e não para nos proteger de Deus. A recíproca é verdadeira, próximos a Ele estaremos por Ele protegidos. Ele ama de tal maneira a Sua criatura que enviou a este mundo o Seu Filho para que buscasse o que se havia perdido. O Senhor Jesus Cristo, igualmente gracioso, misericordioso e amoroso, virá para buscar aqueles que são Seus para que não passem por essa imensa tribulação. Os braços do Pai e do Filho estarão abertos para acolher em Sua morada aqueles que creem. O mesmo Filho que veio pessoalmente uma vez virá pessoalmente de novo. O mesmo Pai que O enviou uma vez O enviará outra vez. Tenha absoluta convicção nisso, meu caro leitor. Permita Deus que assim seja!

autor: José Carlos Jacintho de Campos.