João 2:13-25
Notamos que a festa em Jerusalém, para a qual o Senhor Jesus subiu nessa ocasião, é chamada aqui de “Páscoa dos Judeus”. Não é mais a Páscoa do Senhor (Êxodo 12:27). Após a Sua morte ela foi reduzida a uma festividade religiosa judaica, um ritual somente. Aquele que a Páscoa representava já veio: "Porque Cristo, nossa páscoa, já foi sacrificado" (1 Coríntios 5:7).
Naquele tempo a celebração da páscoa acontecia anualmente no templo em Jerusalém. Era uma das três festas anuais que exigiam o comparecimento de todos os homens, sendo as outras a festa de Pentecostes e a dos Tabernáculos. A festa da Páscoa comemorava o livramento dos judeus da escravidão no Egito (Êxodo 12:1-13) e começava aproximadamente no décimo quarto dia de abril em nosso calendário, durando sete dias ao todo. A Páscoa propriamente era celebrada no dia inicial, seguindo--se depois a festa dos Pães Asmos.
Muitas famílias judias viajavam do mundo inteiro para Jerusalém durante essas festas. Assim, durante a Páscoa, a área do templo ficava sempre abarrotada com milhares de visitantes além dos seus habitantes.
Todo israelita de vinte anos para cima tinha que pagar anualmente na tesouraria sagrada do templo meio siclo como um oferecimento ao Senhor (Êxodo 30:13-15), e isto com a tradicional e antiga moeda hebraica deste valor exato. O povo também era obrigado a oferecer animais como sacrifício pelos pecados. Muitos não podiam trazer consigo seus animais porque vinham de longe, ou porque não dispunham de animais nas perfeitas condições exigidas.
Havia, portanto, grande procura de moedas de meio siclo assim como de animais próprios para os sacrifícios e holocaustos na festa da Páscoa. Para facilitar o comércio, os líderes religiosos permitiam que cambistas de moedas e comerciantes montassem suas bancas e barracas na corte dos gentios no templo, mediante um aluguel. Era lucrativo para os negociantes e rendoso para os sacerdotes, à custa dos que vinham oferecer sacrifício. O templo de Deus estava sendo usado de forma inadequada, e a perseguição do ganho material e o uso de práticas gananciosas predominavam. A Casa de Deus tinha se tornado em uma espécie de bolsa de mercadorias ou feira livre.
O Senhor indignou-Se com isto e, tendo feito um chicote de cordas, expeliu todos do templo com seus animais, espalhou o dinheiro dos cambistas e virou-lhes as mesas, dizendo aos que vendiam as pombas “tirai daqui estas coisas: não façais da casa do meu Pai casa de negócio”, pois estavam fazendo um escárnio da casa de Deus. Ao término do Seu ministério, aproximadamente três anos mais tarde (Mateus 21:12-17; Marcos 11:12-19; Lucas 19:45-48), Ele repetiu esta “limpeza”, pois o motivo de lucro daquela gente era mais forte que o desejo de conservar a santidade do templo.
Deus sempre preveniu Seu povo contra o uso do culto a Ele para o seu próprio enriquecimento. O que o Senhor fez naquelas ocasiões não foi cruel ou injusto, mas era apenas a manifestação da Sua santidade e justiça, o que fez com que Seus discípulos se lembrassem do versículo em Salmo 69:9... “o zelo da tua casa me devorou”. Este salmo é citado dezessete vezes no Novo Testamento e é um dos seis salmos mais citados no Novo Testamento (é citado novamente em João 15:25 e 19:28-29 - os outros salmos que frequentemente são citados são 2, 22, 89, 110 e 118).
Os judeus (entendendo-se aqui os religiosos que administravam o templo) que se consideravam "donos" do templo se indignaram: como não haviam sido consultados, demandaram que o Senhor lhes provasse que tinha autoridade para o que havia feito.
A Sua resposta os deixou espantados, pois declarou “Derribai este santuário, e em três dias o levantarei”. Não prestando muita atenção às palavras que Ele usou, entenderam que o “santuário” seria o templo de onde o Senhor Jesus havia acabado de expulsar os comerciantes e cambistas. Este era o templo construído inicialmente por Zorobabel 500 anos antes, que fora arruinado pela ação dos inimigos e pelo descaso dos judeus, mas estava em fase de reedificação por Herodes, iniciada 46 anos antes (a reedificação só se completou em 65 AD, mas o templo foi completamente destruído pelos romanos cinco anos depois, como fora predito pelo Senhor conforme Lucas 19:41-44). No entender dos judeus, este poder que o Senhor Jesus se arrogava seria uma blasfêmia. Foi disto que O acusaram em seu julgamento diante dos principais sacerdotes e do sinédrio, aceitando um testemunho que distorcia as Suas palavras, pois declarava que Ele dissera: “Posso destruir o santuário de Deus” ao invés de “Desamarrai este santuário” (Mateus 26:61).
A palavra que Ele usou, traduzida como “derribai” foi "luo" que também significa “desamarrai” e a palavra que usou no versículo 19 e os judeus repetiram no versículo 20 é “naos” que se refere ao santuário interior do templo (nos versículos 14 e 15, a palavra usada para “templo” é “hieron” que significa o edifício inteiro: era o pátio exterior que fora contaminado e precisava de uma limpeza, não o santuário interno). A palavra “naos” é usada em 1 Coríntios 6:19 onde lemos que o corpo do crente é o santuário do Espírito Santo.
A palavra traduzida “levantarei” é “egeiro”, que também significa “acordarei” (Romanos 13:11) também traduzida como ressuscitar (dos mortos) em outros lugares (Atos 26:8, 2 Coríntios 4:14, Hebreus 11:19). Ao dizer: “Desamarrai este santuário e em três dias eu o acordarei dos mortos”, significou que eles "desamarrariam" o Seu espírito (por morte do Seu corpo humano) e o próprio Senhor Jesus “o acordaria (Seu corpo) da morte” depois de três dias (Mateus 12:39-41, 16:4). Assim como o Senhor usava parábolas para confundir os incrédulos, Jesus Cristo teria usado essa expressão ambígua para confundir os Seus inimigos. Os Seus ouvintes não deram conta que Ele era maior do que o templo (Mateus 12:6)!
Assim como os judeus, os discípulos também não entenderam o Seu pronunciamento. Somente depois de realizada a ressurreição foi que eles se lembraram, creram nas Escrituras (ferido e esmagado - Isaías 53:5, cortado – Daniel 9:26, sua alma não ficaria no Seol, nem seu corpo veria corrupção - Salmo 16:10), e compreenderam o Seu alto significado. O alto significado foi que, tendo Cristo cumprido tão perfeitamente a Sua predição, ela se tornou em uma das mais fortes provas da Sua reivindicação de ser Deus: só Deus poderia dizer que ressuscitaria o corpo depois de três dias!
Durante a festa, o Senhor fez sinais milagrosos que fizeram com que muitas pessoas vissem e cressem em Seu nome. Mas não era uma fé salvadora: elas somente aceitavam a legitimidade das maravilhas que viam. Embora acreditassem em Seu poder, pelo que testemunhavam, Ele não confiava nelas porque conhecia a natureza humana (Jeremias 17:9), e sabia que sua fé era superficial. Muitas daquelas pessoas que diziam crer no Senhor Jesus naquela ocasião seriam possivelmente os mesmos que mais tarde gritariam “crucifica-O”. É fácil crer quando muitos outros pensam da mesma forma dando um sentimento de bem estar, mas que na realidade é uma falsa segurança.
Mesmo hoje, muitos que dizem que creem em Jesus Cristo não vão além de somente crer nos fatos do Evangelho. A não ser que confiem no Senhor Jesus como seu Salvador, que deu a Sua vida pelos seus pecados e para a sua justificação, sendo Ele a sua única esperança para salvação da condenação eterna pelos seus pecados, e se dispuserem a declarar a sua fidelidade ao Senhor Jesus Cristo, mesmo se correrem risco de morte pelos Seus inimigos, eles não possuem a fé salvadora.