O novo Código Civil e as igrejas

O Novo Código Civil Brasileiro, que entrou em vigor no dia 10 de janeiro de 2002, disciplinou as Associações de forma abrangente, em relação ao Código anterior que tratou do assunto em apenas quatro artigos. Em seu artigo 16 classificava as igrejas como “sociedades religiosas, pias”. Neste novo Código as igrejas estão inseridas como pessoas jurídicas de direito privado - “Associações” (Art. 44), disciplinadas nos artigos 53 a 61, e no que couber, de forma subsidiária, os artigos 966 a 1141, inclusos no Livro II.

Tanto o Código velho como o atual têm trazido muita preocupação e dúvidas por parte dos membros dirigentes de Igrejas, e de forma especial aos membros reunidos nas “casas de oração”, cujos princípios afastam-nas das denominações. Não desejam que sejam conhecidas ostentando nomes próprios, uma vez que se reúnem na simplicidade do Novo Testamento encontrada nos Atos dos Apóstolos. E muitos irmãos têm relutado na elaboração de Estatutos, temendo a indicação de um nome específico.

Entretanto, uma igreja local constituída em pessoa jurídica não perderá suas características neotestamentárias, e estará obedecendo as leis vigentes.

Uma igreja local nasce de forma bastante simples. Uma família, muitas vezes inicia um pequeno trabalho em sua casa convidando os vizinhos. Quando as primeiras conversões ocorrem, o número dos membros começa a crescer. Logo, com a arrecadação de suas ofertas, adquirem um terreno onde constróem uma sala destinada às reuniões. A partir daí surgem algumas questões: em nome de quem se coloca o imóvel, visto pertencer à comunidade? Quem será o responsável perante os órgãos públicos na construção do imóvel? E muitas questões poderiam ser levantadas, todas oriundas deste empreendimento. E aí o que se faz? Surge a necessidade da formação de uma Associação Evangélica que será representada por uma diretoria constituída.

No passado houve a existência de uma Associação que era responsável juridicamente por diversas “casas de oração”. Entretanto, referida Associação passava a ser proprietária dos seus imóveis, sem ter adquirido os mesmos com seus recursos, o que a colocava em situação de risco perante os órgãos públicos. Quando a igreja reunia elementos para sua formação jurídica a Associação devolvia o imóvel em forma de doação. Essa prática revestida de toda a legalidade por muitos anos resolveu o problema de forma satisfatória, sem quaisquer transtornos.

Hoje não mais se aconselha a criação de Associações que venham abrigar “casas de oração”, uma vez que as leis são mais severas e o fisco cada vez mais exigente.

Outra prática adotada e que aponta para diversos riscos, é a indicação de um ou dois membros como adquirentes do imóvel. Passam, assim, a serem os legítimos proprietários de um imóvel que foi adquirido por toda a comunidade. E nesta circunstância, devem incluir o imóvel em sua declaração de imposto de renda, terem os recursos suficientes para esta pseudotransação, e se responsabilizarem diante dos órgãos públicos.

Tal procedimento é deveras temerário, pois ocorrendo a morte de um dos “proprietários”, surgem herdeiros que deverão ser habilitados em inventário, transferindo-se a propriedade para os mesmos. E quando são pessoas sem qualquer vinculação com a igreja, podem existir demandas para a garantia dos direitos de propriedade.

Por tais razões, cada Igreja local deve proceder a sua formação em Associação, cumprindo as exigências legais e fugindo de todos os embaraços que possam surgir.

Algumas providências a serem tomadas:

  • A igreja local deverá anunciar uma Assembléia e expor a todos os membros a necessidade de sua regularização.
  • Caso esteja formada com um corpo de presbíteros, o que independe de sua formação jurídica, estes poderão indicar aos membros as pessoas capacitadas para exercerem a representação da igreja como pessoa jurídica. Os membros escolherão as mesmas para Presidente, Secretários (1º e 2º), Tesoureiros (1º e 2º). Uma vez concluída a referida escolha, uma ata deverá ser lavrada, com a assinatura de todos os membros presentes.
  • Em seguida, a nova diretoria deverá apresentar os Estatutos, os quais deverão ser elaborados por um advogado, observando todos os requisitos contidos no novo Código Civil. Uma vez concluídos os Estatutos, uma ata deverá ser lavrada com a transcrição dos mesmos.
  • Assim, tanto a composição da nova diretoria como os Estatutos, deverão ser encaminhados para o Registro Civil das Pessoas Jurídicas onde se localiza a sede da Igreja.
  • Uma vez registrados os Estatutos, o passo seguinte é tirar uma cópia dos mesmos, e entregá-los a cada membro mediante recibo. Em seguida os Estatutos deverão ser encaminhados a um Contador, o qual cuidará da formalização perante a Receita Federal (inscrição do CNPJ - Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas); Ministério do Trabalho (livro de empregados); Caixa Econômica Federal (FGTS); INSS, entre outros órgãos públicos.

Quanto às Igrejas que já possuem Estatutos registrados:

  • Para estas os procedimentos acima são dispensáveis, uma vez que já existem.  
  • Entretanto, os Estatutos deverão ser reformulados para serem adaptados ao novo Código Civil. Novamente o Advogado deverá cuidar dos mesmos, a fim de que sejam elaboradas as alterações. Uma vez concluídas e aprovadas em Assembléia Geral por dois terços dos presentes, os Estatutos deverão ser levados para o Registro das Pessoas Jurídicas onde se localiza a sede da Igreja. Uma vez registrados, uma cópia dos mesmos deverá ser entregue aos membros mediante recibo.
  • O novo Código Civil estabeleceu o prazo de um ano para as adaptações exigidas: “As associações, sociedades e fundações, constituídas na forma das leis anteriores, terão o prazo de 1 (um) ano para se adaptarem às disposições deste Código, a partir de sua vigência; igual prazo é concedido aos empresários” (Art. 2031).

Algumas dicas importantes:

  • Fazer um cadastro de todos os membros com seus dados pessoais (idade, estado civil, profissão, residência, data de batismo etc), documentos de identidade (RG e CPF), guardando-os em pastas próprias.
  • Elaborar um documento que deverá ser assinado pelo membro, que está ciente do conteúdo dos Estatutos. Os menores de 18 anos devem assiná-los assistidos pelos seus responsáveis.
  • Nas Assembléias, por ocasião dos votos, os menores de 18 anos não poderão votar (para tanto o cadastro vai ajudar neste aspecto).
  • As atas devem ser bem legíveis, sem emendas ou rasuras em livros próprios, sem espaços em branco.
  • Atentar para o número dos votantes na Assembléia Geral, quando os administradores (diretoria) forem destituídos, quando as contas forem aprovadas, ou quando os estatutos forem alterados. É exigido o voto concorde de 2/3 dos presentes à Assembléia (Art.59). Os menores de 18 anos não serão contados.  
  • Os Estatutos devem ser bem específicos, especialmente em casos de admissão e exclusão de membros, pois não havendo previsão estatutária o membro atingido poderá recorrer ao Judiciário. Portanto, na redação dos Estatutos devem ser considerados direitos individuais e constitucionais (exemplo de casal amparado pela união estável, sem casamento pelas leis civis, que desejam se filiar à Igreja). Esta situação deverá ser bem definida nos Estatutos pela Igreja.  
  • Os imóveis deverão estar registrados em nome da Associação e toda documentação dos bens móveis regularmente contabilizada;
  • As entradas e saídas devem estar em ordem, assim como os livros a fim de serem exibidos ao Fisco assim que exigidos;
  • Entregar sempre uma cópia dos Estatutos para o novo membro, mediante recibo, declarando que está ciente e que concorda com os mesmos;
  • Definir nos Estatutos datas para as Assembléias Ordinárias, quando assuntos sobre o funcionamento da Igreja deverão ser tratados, e quando será escolhida nova diretoria.
  • Definir nos Estatutos datas para Assembléia Geral a fim de serem tratados assuntos como Prestação de contas, aprovação das mesmas, plano para o próximo ano, etc.

Diante destas exigências legais, cumpre a cada igreja local dar início a tais procedimentos. Mãos à obra!

autor: Orlando Arraz Maz.