Desculpe-me, mas acontece que eu gosto das igrejas locais.
Parece ser quase contraproducente dizer algo assim.
A "moda" é criticá-las, apontando as suas falhas e erros. Há muitos críticos que pontificam o que está errado nelas. Talvez esteja na hora de alguém se levantar e dizer o que há de bom nelas.
Gostaria de ser esta pessoa. Permita-me contar porque gosto delas.
Gosto de lembrar semanalmente do Senhor, ao partir do pão. Por 50 anos tenho procurado lembrar-me do Senhor todos os domingos, à mesa dEle, e isto nunca perdeu o encanto para mim. Há algo de especial numa reunião onde o nosso amado Senhor é a única atração e o centro da adoração. Não é de se admirar que quando certas pessoas deixam a igreja local para um tipo diferente de comunhão, geralmente dizem: "sinto muita falta da reunião de adoração". Lamento que elas a tenham deixado.
A igreja local se torna preciosa para mim porque vejo Efésios 4:12 praticado como em nenhum outro lugar. Os dons foram dados com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço. Tenho visto homens iletrados amadurecerem ao ponto de pregar o Evangelho com poder convincente. Tenho visto homens simples ministrando aos corações do povo de Deus e não apenas aos seus intelectos. Vejo mulheres devotas se realizarem não apenas criando filhos e filhas para Deus, mas também ensinando outras mulheres e crianças, cooperando assim com seus maridos, por apoiar o seu ministério, ajudando o trabalho missionário no país e no exterior, visitando doentes e aflitos, e dando hospitalidade tanto para santos como para estranhos. Tenho visto moços sendo encorajados a exercer os seus dons de um modo que nunca poderia haver em outro ambiente.
Muitos proeminentes líderes evangélicos demonstram admiração por Efésios 4:12, e alguns até louvam as igrejas locais pela maneira como o praticam.
Uma das glórias das igrejas locais é a sua recusa absoluta em dividir a irmandade em clero e leigos. Reunir-se ao redor da pessoa de Cristo, ao invés de ao redor de um pregador carismático, tanto em princípio como na prática. O Novo Testamento ensina que deve haver uma pluralidade de anciãos e nunca um ministério por um homem só. Mas as igrejas locais que pregam e praticam esta maneira serão sempre como aves raras na comunidade cristã. Há como que uma certa reprovação em pertencer à igreja local, e os que se reúnem nela devem estar preparados para suportar tal opróbrio.
Gosto do fato de que cada igreja é autônoma, responsável somente perante o Senhor. Não há sede na terra, nem hierarquia ordenada pelos homens, nem organização entre a Cabeça e o Corpo. Isto impede que liberalismo, doutrinas falsas ou ditaduras tomem conta das igrejas locais.
A programação financeira das igrejas locais é louvável. É singular que, na maior parte delas, exista uma única oferta semanal. Esta oferta, recolhida sem fanfarras ou apelos, é suficiente para suprir as despesas locais e também ajudar obras cristãs em toda a parte. Tradicionalmente, obreiros de tempo integral dependem somente do Senhor para suprir as suas necessidades, sem ter que publicá-las. O mundo não pode dizer das igrejas locais o que diz da cristandade em geral: "A igreja só quer o seu dinheiro".
Aprecio o fato de que as igrejas locais estão prontas a exercer disciplina justa quando necessário, mesmo que assim o fazendo limite as oportunidades de se tornarem igrejas enormes. Estão contentes em julgar as suas comunidades, não pelo tamanho, mas pela santidade dos seus membros.
O ministério de literatura das igrejas locais tem sido saliente. Talvez tenha sido esta a sua maior contribuição no cenário evangélico. Os escritos de Darby, Kelly, Mackintosh, Vine e muitos outros exerceram profunda e benéfica influência pelo mundo afora. Há alguns anos o bibliotecário de um colégio cristão tentou compilar a bibliografia dos escritores dos "irmãos". Logo percebeu que não lhe seria possível terminar o projeto.
Devemos mencionar o movimento missionário associado às igrejas locais, um movimento que excede a proporção do número de igrejas locais que o sustentam.
Outras pessoas têm outras razões para gostar das igrejas locais, algumas até um tanto estranhas. Por exemplo, uma irmã que recentemente entrou em comunhão, após anos de "pular de igreja em igreja", disse de sua satisfação em estar numa igreja com liderança masculina. Isto é estranho na época da liberação feminina! Provavelmente poucos grupos fazem tanta autocrítica como as igrejas locais. Francamente, sinto que isto é feito em demasia e que acaba levando pessoas sensíveis a uma desnecessária resignação. E assim muitos se desviam. A crítica vem melhor depois do louvor. Está na hora de equilibrarmos ambos.
O precedente não quer dizer que estou satisfeito com o estado atual. Reconheço que existem áreas onde precisamos melhorar, tais como métodos evangelísticos e o desenvolvimento da liderança na igreja local. Mesmo confiando inabalavelmente em princípios bíblicos, reconheço a necessidade de mudar os métodos vez por outra. Concordo que alguns de nós, incluindo os jovens, têm preocupações legítimas, e precisam ser ouvidos.
Mas em vez de chamar o pelotão de demolição, precisamos arregaçar as mangas e enfrentar os problemas. Tenhamos homens que nos mostrem como fazer um serviço construtivo em vez de generais de poltrona que se posicionam contras as igreja locais ou que as abandonem de vez. E os que recebem sustento das igrejas locais deveriam demonstrar lealdade e evitar até a aparência de "morder a mão que os alimenta".