Compilado por Grace Jones
Algum tempo depois da sua conversão, meu pai começou a sentir que o Senhor o estava chamando para trabalhar em tempo integral como missionário no exterior. Ele era membro de uma igreja que se reúne em Clumber Hall, na cidade de Nottingham. Embora professor na escola dominical e bem ativo nos trabalhos de evangelização promovidos pela igreja, inclusive reuniões ao ar livre, ele sentia que o Senhor queria que ele fosse levar a mensagem do Evangelho a outro país mais carente.
A esta altura ele e minha mãe já eram noivos. Tanto ela como a família dela não gostavam da idéia, pois ela era a caçula em uma família bastante unida e amorosa. Mas, depois de se casarem, meu pai ainda sentia que Deus o estava chamando para o serviço missionário e sentia-se culpado por não obedecer.
Minha mãe continuava a resistir, até que um dia, enquanto estava ocupada com serviços caseiros e pensando sobre o assunto, um pensamento lhe veio à mente: "Deus me deu este marido, mas se eu tentar impedi-lo de fazer o que Deus quer que ele faça, Deus poderá levar meu marido para Si!". Foi um pensamento muito solene, portanto ela passou a pedir a Deus que se Ele realmente queria que eles fossem trabalhar como missionários, que Ele tirasse dela todo o seu medo e falta de vontade. Uma manhã, quando ela acordou, ela sentiu que realmente não tinha mais medo nem objeções. Então ela contou isso ao meu pai – deve ter sido um grande alívio para ele!
Como meu pai falava bem o francês, acharam que provavelmente iriam à Algéria ou ao Congo Belga, onde o francês é a língua oficial. Mas não tinham certeza, então continuaram orando e pedindo a Deus que os guiasse. Depois de algum tempo houve uma conferência missionária em Clumber Hall e, como era costume, havia uma banca com livros missionários à venda. Meus pais decidiram comprar um livro para cada um. Assim fizeram e o livro que minha mãe comprou foi "Aventuras com a Bíblia no Brasil" – escrito por um "colportor" no começo do século XX, chamado Frederick Glass.
À medida que lia o livro, ela passou a sentir uma grande certeza de que era o Brasil o país ao qual Deus os chamava, mas ela não disse nada ao meu pai e quando ambos haviam lido seus livros, eles os trocaram e cada um leu o livro do outro. Quando meu pai terminou de ler o outro livro, ele disse à minha mãe, no dia seguinte: "Tenho certeza de que Deus quer que vamos ao Brasil". É lógico, isso confirmou o que minha mãe havia pensado e foi assim que chegaram à decisão.
Informaram a igreja e depois de orarem sobre o assunto a igreja confirmou a decisão. Em seguida comunicaram à família da minha mãe, que foi muito do contra, e o pai dela até se negou a se comunicar com eles durante uns dois anos, quando já estavam no Brasil! Foi muito difícil para ela porque era uma pessoa muito amorosa. Mas, enfim, eles se reconciliaram e o pai dela começou a lhes escrever.
Chegaram ao Rio de Janeiro em 3 de dezembro de 1925 e foram acolhidos pelo irmão Percy Ellis e esposa, que não haviam conhecido previamente, mas que lhes hospedaram no seu próprio lar durante um mês. Depois alugaram um quarto para si e mais tarde ficaram na casa de uma família cristã enquanto esta foi viajar.
Depois de uns 9 meses no Rio a família voltou e meus pais acharam que já conheciam o idioma português o suficiente para começar a trabalhar por conta própria em outro lugar. Julgaram que deveriam ir para algum lugar onde não houvesse qualquer trabalho evangélico. Examinando o mapa do Brasil viram a cidade de Uberaba e acharam que talvez fosse um bom lugar para começar. Como ninguém soubesse muito acerca dessa localidade, depois de orar eles indagaram da Sociedade Bíblica do Brasil se podiam informar algo a respeito dessa cidade. A pessoa com quem falaram lhes disse: "Pelo que podemos ver pelos registros, não deve haver qualquer trabalho ali – faz anos que não temos qualquer pedido de Bíblia dali!" E foi assim que decidiram ir para Uberaba.
Naqueles dias a viagem do Rio até Uberaba só era possível de trem, via São Paulo, e era uma viagem longa e cansativa. A viagem durou quase dois dias e eles não conheciam ninguém – nem em São Paulo nem em Uberaba.
Em Uberaba eles inicialmente foram se hospedar num hotel barato. No dia seguinte à chegada, acharam que já era tempo de começar a pregar ao ar livre. Foram primeiro ao delegado de polícia para ver se seria necessária qualquer autorização oficial. Ele lhes perguntou o que iriam pregar e qual era a sua religião, em resposta meu pai abriu sua Bíblia em Mateus 5 e leu parte do Sermão da Montanha. Quando terminou, o delegado disse: "Se é isso que vocês vão pregar, esta cidade precisa disso – é uma verdadeira Babilônia!". Mas, só para ter certeza, ele iria consultar o quartel-general em Belo Horizonte, e pediu-lhes que voltassem no próximo dia.
Mais tarde, naquele mesmo dia, eles estavam sentados num banco numa praça da cidade e uma senhora sentou-se ao lado deles e começou a conversar. Quando ela ouviu que eram missionários evangélicos, ela disse: "Esta cidade é muito religiosa!". Mais tarde, pela experiência, descobriram que ambas as afirmações eram verdadeiras.
No dia seguinte voltaram ao delegado que havia recebido uma resposta positiva de Belo Horizonte – eles poderiam ter suas reuniões, contanto que não se envolvessem de qualquer maneira com política, que logicamente eles não tencionavam fazer. No mesmo dia, à noite, fizeram a sua primeira reunião ao ar livre numa praça, só os dois. Começaram a cantar e, como ambos tinham boas vozes, atraíram um grupo de pessoas, a quem foi pregada a primeira mensagem do Evangelho. Eles notaram que havia soldados estacionados nos quatro cantos da praça! Evidentemente o delegado não queria qualquer problema ou talvez os soldados estavam ali para proteger esses estrangeiros. E foi assim que tudo começou!
Desde aquele dia, em 1926, o Evangelho tem sido pregado fielmente em Uberaba e mais tarde em muitas cidades e aldeias circunvizinhas. De certo meus pais ficariam muito surpresos e felizes se soubessem quantas casas de oração existem agora no Triângulo Mineiro e por todo o Brasil!
Adendo
O Sr Ricardo e Da. Maria Helena, meus progenitores, exerceram um profícuo trabalho de evangelização e ensino, verbalmente e através de livretos, revistas e notas para professores de Escolas Dominicais, nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, sendo levados à presença do Senhor já idosos mas ainda firmes no trabalho quando residiam em Piracicaba-SP.