João 5:31-47
Há uma tendência comum, mesmo entre os que se dizem “evangélicos”, de não levar a sério partes do Velho Testamento. A seu ver, são pouco mais do que histórias e tradições antigas dos judeus, que apenas podem servir como parábolas e ilustrações. Ficam até surpresos quando descobertas arqueológicas recentes provam a exatidão da geografia e da história bíblica.
Em defesa da sua posição, tomam uma atitude de oposição ao relato bíblico, a partir dos primeiros capítulos do livro de Gênesis, pois preferem crer na teoria da evolução, que é incompatível com ele. Quando alguém começa a fazer um ataque ao Velho Testamento, ele está imprudentemente fazendo um ataque sutil ao Senhor Jesus, pois o Velho Testamento é o fundamento do Evangelho de Cristo.
Moisés escreveu os primeiros cinco livros da Bíblia, e ali se encontra a lei de Deus dada ao povo de Israel por meio de Moisés, não somente os dez mandamentos que foram escritos em pedra e colocados dentro da “arca do concerto”, mas toda a legislação própria para a sua nação.
Nessa lei a declaração de alguém não era aceita como testemunho se fosse a respeito dele próprio (Deuteronômio 19:1; Mateus 18:16; 2 Coríntios 13:1; 1 Timóteo 5:19). Em João 8:12-19 o Senhor Jesus reivindica que Seu testemunho de Si próprio é verdade porque o Pai dá confirmação à Sua mensagem, sendo o Pai e o Filho as duas Testemunhas (capítulo 8:17). É um paradoxo e, assim mesmo, é verdadeiro.
No entanto, o Senhor ainda Se submete à demanda rabínica para evidência de outros, porque não aceitariam o testemunho d’Ele próprio (capítulo 3:11). Ele lhes declara que têm o testemunho do Pai (versículos 32, 37, capítulo 8:17), de João Batista (versículo 33), das Suas obras (versículo 36), e das Escrituras (versículo 39), particularmente o de Moisés (versículo 45).
Quanto a João Batista, seu testemunho era um fato oficial e permanente porque eles próprios tinham enviado uma comitiva a João e ele lhes tinha dado o seu testemunho pessoal, que deveria ser reconhecido como sendo confiável pelo sinédrio (capítulo 1:19-28). O testemunho de João Batista era de valor permanente e contínuo, sendo este o propósito da sua missão (capítulo 1:7).
Mas o Senhor não recebe o testemunho de apenas um homem como João: ele foi a menor das testemunhas, contudo foi dado, como os outros, a fim de que pudessem crer e ser salvos. Isto era o propósito da vinda de Cristo, que o mundo pudesse ser salvo (capítulo 3:17). Ele sentia intensamente a tarefa que lhe fora designada pelo Pai (capítulo 3:35) e declarou ao fim que a tinha executado (capítulo 17:4; 19:30).
A esta hora João tinha sido aprisionado, seu ministério ativo havia se encerrado, e o seu propósito tinha sido realizado - é por isso que o pretérito perfeito foi usado no versículo 35. João não era a Luz (capítulo 1:8), mas uma lâmpada, ou vela, brilhando na escuridão.
Como uma vela que é acendida e queima, e assim é consumida, João anunciou a vinda do Cordeiro de Deus para trazer salvação aos que se achavam na escuridão do pecado, como esses judeus. Eles se mostraram dispostos a aceitar João, por causa da sua popularidade temporária (capítulo 1:19; Marcos 1:5; Mateus 3:5, 11:7, 21:26), mas a luz que João estava brilhando realmente não iluminou as suas mentes. O interesse que tinham era um entusiasmo frívolo, superficial e efêmero, só por uma hora, e depois se voltaram contra ele.
Quando a Luz vem, não mais se precisa da lâmpada. Assim quando o Senhor Jesus que, conforme Ele próprio declarou, é a Luz do Mundo (capítulo 8:12, 9:5, 12:46) começou o Seu ministério, João foi extinto. Todos os crentes são de certo modo a luz do mundo (Mateus 5:14) porque o mundo recebe a Luz de Cristo por nosso intermédio.
Bom como era o testemunho de João, Cristo tinha testemunho superior.
Embora o Senhor Jesus mantivesse que a forma mais elevada de fé não precisava da evidência das obras (capítulo 2:23; 10:38; 14:11), as próprias obras:
- levavam o selo da aprovação do Pai (capítulo 5:20-36, 10:25);
- provavam que o Pai O tinha enviado, e
- não podiam ser rejeitadas como testemunho (capítulo 10:25, 10:37, 15:24), porque eram as Suas credenciais. Ele saia com as multidões, nas estradas principais e pelos caminhos e, à medida que Se movia, o povo era curado. As declarações que se fazem dizendo que hoje existem pessoas que têm o mesmo poder que Jesus tinha é blasfêmia neste contexto, porque a singularidade dos milagres que Ele executou atesta que Ele era o Filho de Deus.
O próprio Pai tinha dado o Seu testemunho. Ao invés da voz do Pai em Seu batismo (Marcos 1:11), na transfiguração (Marcos 9:7), ou quando da visita dos gregos (capítulo 12:28), a maneira de falar do Senhor aqui indica que estava Se referindo ao testemunho do Pai no coração dos crentes (1 João 5:9, 10). O testemunho de Deus não veio de Si próprio em voz audível nem em forma visível (capítulo 1:18, 6:46; 1 João 4:12), mas o Senhor disse mais tarde que aqueles que O tinham visto tinham visto o Pai (capítulo 14:9), significando que tanto a voz como a forma da voz do Pai eram distintas das do Filho.
A Palavra de Deus tinha vindo através dos séculos pelos profetas para estes líderes dos judeus, mas não habitava neles (capítulo 10:35, 15:3, 17:6; 1 João 1:10, 2:14), pois embora pudessem conhecê-la bem, escolheram não crer n’Aquele a quem o Pai enviou: o Messias. Embora Ele lhes tivesse dado a Palavra de Deus, eles rejeitaram tanto Sua pessoa como a Palavra de Deus (capítulo 14:9-10).
Jesus lhes disse que examinavam as Escrituras (Mateus 21:42; Lucas 24:27) porque pensavam que tinham nelas a vida eterna: certamente os seus rabinos utilizavam formalmente a letra das Escrituras como um meio de salvação. Mas o verdadeiro valor das Escrituras está no testemunho que dão do Messias, e eles não queriam vir a Ele para que pudessem ter vida (capítulo 20:31): Jesus era rejeitado por eles porque amavam a escuridão em vez da luz (capítulo 3:19).
O Senhor não esperava mera honra e elogio dos homens (versículo 34), porque o Seu motivo não era a ambição. Ao contrário dos judeus (capítulo 12:43; Mateus 6:1) Ele não buscou a Sua própria glória, mas a glória e comunhão do Pai (capítulo 1:14, 2:11, 7:18). Ele os conhecia como só Deus pode, e reconhecia que eles não amavam a Deus e consequentemente não receberam Aquele que veio em nome do Pai. Sete vezes neste Evangelho o Senhor falou do "Nome" do Pai (capítulo 5:43, 10:25, 12:28, 17:6,11,12,26).
Os líderes religiosos dos judeus naquele tempo estavam dispostos a receber pessoas que chegavam à proeminência messiânica “em seu próprio nome”, seja quem fosse. Eram crédulos com respeito aos falsos messias, mas incrédulos sobre Ele que fornecia toda essa evidência. Um dia o Anticristo virá em seu próprio nome, terá uma imagem feita de si e o mundo, tendo rejeitado Cristo, o acolherá.
Eles não eram verdadeiros judeus (Romanos 2:29; Ester 9:28) porque não buscavam a honra que só vem de Deus, mas preferiam o elogio dos homens (Mateus 6:1, 23:5), como os fariseus que temiam confessar a Cristo (capítulo 12:43).
Até mesmo Moisés, em quem tinham colocado a sua esperança, escreveu sobre o Senhor Jesus (Deuteronômio 18:18; João 3:14, 8:56): se não acreditavam no que ele escreveu, como acreditariam nas Suas palavras sobre Abraão que previu o dia de Cristo? O Senhor confirma aqui claramente o fato que Moisés escreveu porções do Velho Testamento (também veja Lucas 24:27-44). A autoridade de Moisés era a maior de todas para os judeus. Não havia resposta dos rabinos para esta conclusão de Cristo.
A Bíblia, contendo o Velho Testamento e completada pelo Novo Testamento, não é uma simples coleção de livros religiosos, mas é a preciosa mensagem de Deus através dos Seus servos, portadora da Sua luz desde Moisés até o apóstolo João, para o conhecimento de todo o mundo. O Senhor disse ao profeta Isaías: “Pouco é o seres meu servo, para restaurares as tribos de Jacó e tornares a trazer os remanescentes de Israel; também te dei como luz para os gentios, para seres a minha salvação até à extremidade da terra”. (Isaías 49:6).